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Quem é o estudante que tem acesso livre para publicar no Notícias do Dia?

Texto da Resistência Popular Estudantil – Floripa publicado no Repórter Popular.

Antonio José de Pinho é um professor de Português e estudante de doutorado em Linguística na Universidade Federal de Santa Catarina. No dia 05 de junho, ele publicou o artigo de opinião “Por que a UFSC não retorna suas atividades?, em que defende que o verdadeiro motivo para a ausência de ensino remoto é a vontade de professores tirarem “férias fora de época”.

Após a repercussão bastante negativa de seu texto na comunidade universitária, que incluiu uma resposta pública da Representação Discente de seu curso desmentindo suas alegações, Pinho foi novamente ouvido pelo jornal, retratando no título seu discurso de que está sofrendo assédio moral e que não há espaço para a “pluralidade de pensamento”. O estudante ainda aproveitou o jornal para reverberar sua ameaça de processo às estudantes que se opuseram a ele.

A Associação de Pós-Graduandas e Pós-Graduandos da UFSC (APG), em nota recente, denunciou que foi buscada pelo jornal, mas apenas para dar um depoimento de crítica à universidade por não ter adotado o ensino remoto. A posição da entidade, que representa uma categoria de mais de 14 mil estudantes – entre eles Antonio Pinho – não foi contemplada no veículo. Segundo a APG, a mídia empresarial catarinense está bastante empenhada em atacar a universidade a partir do ponto de vista de setores patronais como o grupo “Floripa Sustentável”, citado em várias matérias recentes.

Porém, cabe além disso perguntar: Pinho é apenas mais um estudante cujas opiniões estão alinhadas ao empresariado local? Ou há algo mais a ser analisado sobre o espaço que ele vem recebendo?

Uma figura carimbada na política universitária e florianopolitana

Antonio José de Pinho ficou bastante conhecido na universidade por ter criado os grupos Juventude Conservadora da UFSC e UFSC Conservadora em 2012. Após meses utilizando as páginas para disseminar conteúdos como o ódio a gays e lésbicas e o repúdio às cotas raciais, Pinho recebeu uma notificação da Coordenadoria de Processos Administrativos Disciplinares da UFSC exigindo que parasse de utilizar o nome da universidade e tirasse o site do ar. O caso ganhou repercussão nacional, sob a acusação de Pinho de que sofria perseguição.

Em 2013, Pinho ajudou a organizar uma manifestação contra a vinda de Cesare Battisti na UFSC. Entre os demais organizadores, estava a então estudante Ana Caroline Campagnolo, atual deputada estadual bolsonarista em Santa Catarina que ganhou renome nacional pelas sucessivas campanhas de censura e denúncia contra professoras.

O estudante realizou seu mestrado em Linguística na UFSC entre 2010 e 2012, orientado por Felício Margotti, então diretor do Centro de Comunicação e Expressão, com quem já havia pesquisado junto desde a graduação. Segundo ele, teve sorte de encontrar “um orientador não ideológico. Curiosamente, esse professor “não ideológico” foi também Pró-Reitor de Graduação e, no contexto de uma ocupação estudantil à qual se opunha politicamente, agrediu um estudante e tentou empurrá-lo da escada – motivo pelo qual enfrentou uma campanha por sua exoneração.

Durante o processo de seleção para o doutorado em Linguística que o estudante tentou para 2014, Pinho chegou atrasado, foi impedido de fazer a prova e ameaçou agredir uma professora presente. Segundo a ata do processo de seleção, ele teria “proferido ameaças que fizeram com que a segurança da UFSC fosse acionada. Os seguranças contiveram o candidato e a professora, após a realização da prova, registrou boletim de ocorrência junto à Polícia Civil e, posteriormente, junto ao Departamento de Segurança da UFSC, pelas agressões e pelo desacato sofridos”. É apenas vários anos após o episódio que Pinho volta a ingressar no programa.

Em um vídeo de 2016, Pinho entrevista o professor Marcelo Carvalho, do Departamento de Matemática da UFSC, junto a João Victor Gasparino da Silva. Gasparino, também membro do site UFSC Conservadora, ganhou renome nacional em 2013, após um texto seu ser divulgado nas páginas da Revista Veja e no portal G1, no qual respondia a um professor que supostamente havia pedido pela realização de um trabalho sobre Karl Marx. O professor Marcelo Carvalho, tratado como referência pelos jovens no vídeo, é um defensor aberto do integralismo, a versão brasileira da doutrina fascista, como pode ser atestado pela letra sigma na parede de sua sala, vista ao fundo no vídeo, símbolo da ideologia de extrema-direita. Outros vídeos do professor podem ser encontrados no canal de youtube UFSC Conservadora.

O que o estudante defende

Uma análise mais detida do blog pessoal de Antonio Pinho, assim como das páginas da UFSC Conservadora e Juventude Conservadora da UFSC, são reveladoras.

Segundo Pinho, seu “bisavô era conhecido na região onde morava por ser muito bondoso com seus escravos e, na decisão pelas ações afirmativas, o STF “reescreve a história e demoniza os antigos escravocratas (…) como se todo proprietário de escravos fosse essencialmente cruel no relacionamento com seus negros”. Para ele, o “imaginário do senhor de escravo cruel foi sendo progressivamente construído, porém não tem embasamento histórico”.

Em um artigo escrito em 2013, Pinho acusou um ato feminista em Florianópolis de instigar “as mulheres a destruírem suas famílias por qualquer motivo” e de ser “uma manifestação local de tudo o que defendem os globalistas instalados na ONU, que trabalham dia e noite pelo advento do satânico e totalitário governo mundial”. Segundo ele, o feminismo é um “vírus destinado a destruir o Ocidente cristão” e “gayzismo, movimentos indígenas e negros” também são “meios que o marxismo cultural tem se usado em sua tarefa de corrosão da sociedade”.

Em um texto no qual relata a criação da Juventude Conservadora da UFSC, Pinho relata os objetivos do grupo em realizar uma “verdadeira guerra cultural de longo prazo contra a guerra cultural silenciosa do marxismo” e “defender os valores legados pela civilização Ocidental Cristã”. O site do grupo, criado em junho de 2012, havia sido retirado do ar em agosto do mesmo ano, mas supostamente retornou em 2013 e ainda pode ser acessado atualmente.

Por fim, ele defende ainda que o aquecimento global é “uma mentira; que “vacinas provocam mais efeitos colaterais nocivos que benefícios à saúde; que a aprovação do casamento gay tem por objetivo a “redução da população; e que a “meta última” do movimento gay é a “aceitação da legalização da pedofilia.

O que espera o jornal Notícias do Dia?

Como vimos, o jornal Notícias do Dia fez muito mais do que apenas encontrar um estudante que pudesse reforçar a narrativa e os interesses dos patrões da cidade, de que as aulas devem voltar remotamente de qualquer forma, o quanto antes. O jornal escolheu um estudante ultra-conservador, violento, extremamente racista, misógino e homofóbico, cujas referências políticas flutuam entre o monarquismo, o integralismo e Olavo de Carvalho.

Por que essa figura volta a aparecer no debate público da cidade justamente em 2020, ano eleitoral? Será por isso que Pinho criou uma página do facebook em seu nome recentemente, onde dissemina postagens de Olavo de Carvalho, em defesa do agronegócio, da monarquia, de privatizações, onde faz críticas ao movimento negro e também ao isolamento social na pandemia? E, se for esse o caso, o jornal Notícias do Dia está ciente de que está dando plataforma para ampliar o alcance de um defensor dessas ideias?

A função social do jornalismo de informar a população, fomentar debates na sociedade e investigar os poderosos não poderá nunca existir dentro da atual estrutura empresarial, em que os interesses econômicos ditam, em última instância, toda a linha editorial. É papel de todas e todos nós criar outros veículos, iniciativas, por uma mídia a serviço das classes oprimidas!

As fotos foram retiradas deste texto de Lola Aronovich.

Nossa força move o mundo: lançamento da Campanha de Luta por Vida Digna

CAMPANHA DE LUTA POR VIDA DIGNA
PAUTA DE EMERGÊNCIA POPULAR CONTRA O CORONAVÍRUS
NOSSA FORÇA MOVE O MUNDO, LUTAMOS POR VIDA DIGNA!

Nossa luta nunca parou. Ao redor do mundo, são os nossos braços que constroem e operam máquinas, que dirigem e entregam mercadorias, que projetam, fabricam, embalam, distribuem e vendem produtos. Nossa vida como povo sempre dependeu de estarmos na ativa, firmes e fortes, mesmo nas piores condições.

Condições que pioraram nos últimos anos. O governo, junto com os mais ricos do Brasil, flexibilizaram as leis trabalhistas (nossas garantias), precarizaram nosso trabalho (nossa dignidade), colocaram milhões na rua (nosso ganha-pão) e por fim, aos que ficaram, sobrou trabalhar quase que de graça.

Os investimentos nos serviços públicos diminuíram, fazendo a qualidade piorar. Muitas vezes nos fazendo correr atrás de convênios de saúde ruins para resolver problemas que antes eram resolvidos no postinho, ou ficar meses em uma fila da creche e ter que deixar o filho cada vez mais longe de casa. Depois de anos trabalhando e contando os dias para a aposentadoria, parece que agora nem adianta mais contar. Se temos um benefício baixíssimo do governo, outro que aparece não podemos ter. O pouco que falta é muito para quem não tem nada. Cada dia mais estamos sendo encurralados por quem não parece se importar.

Hoje, com a pandemia, a situação fica ainda mais perigosa e injusta. Ditam como essenciais atividades que mantém a vida dos mais ricos confortáveis e se não concordamos, somos dispensadas e dispensados. Não nos dão importância, nos matam ao nos deixar sem proteção trabalhando, não existe opção para quem depende de baixo salário. O deslocamento faz parte do trabalho, a aglomeração faz parte do trabalho.

Matam nossas crianças, entram em nossas vilas com tratores e em nossas casas sem permissão e continuam fazendo isso na pandemia. Parece que esse trabalho não foi interrompido, pelo contrário, estão matando mais pretas e pretos, pobres e mulheres.

Todos os dias vemos os povos indígenas exigindo que parem de matá-los também, de matar a natureza. Os indígenas dizem que a natureza revida. Nas chuvas, no frio e no calor, todos nós sentimos isso. Perdemos nossos bens, os peixes param de vir, as plantações sofrem e a noite nós pensamos: “Como podemos sobreviver mais amanhã?”. Não existe lugar em que possamos ir para resolver nossos problemas. Não existe fila que resolva.

A destruição dos nossos recursos naturais, das nossas águas e da nossa terra está na agenda dos grandes senhores do capital. Além disso, nossos povos originários e comunidades tradicionais gritam de dor e exclamam suas defesas em nome dos ancestrais caiçaras, coletores, marisqueiras e pescadores que cuidam de nossas matas, rios, lagoas, mares e terras produtivas para o povo.

Por isso, como trabalhadores, estudantes, desempregadas e desempregados, militantes e lutadoras e lutadores populares, jovens de periferia e do campo, gente que vive do seu trabalho e não aceita as condições horríveis que lhes são impostas, estamos organizadas e organizados em uma ampla campanha de luta por vida digna, contra a vida cara e violenta que nos é imposta e contra o horror da pandemia.

Nem aceitar passivamente a situação, nem deixar que o medo nos paralise: estamos em todo o país, nos organizando como pudermos para fazer ações de solidariedade, nas vilas e nas favelas. E nos colocando a serviço de quem precisa, sem nunca parar de dizer que essa crise tem culpados. Sem desistir de lutar por uma vida digna.

Diante deste cenário, nossas demandas e ações nesta campanha incluem diferentes eixos:

1) SAÚDE PÚBLICA E UNIVERSAL

Requisição dos meios particulares para ampliação do sistema público e gratuito do SUS. Testagem em massa e gratuito para trabalhadoras e trabalhadores, ampliação do número de agentes comunitários de saúde, estendendo para além da pandemia a maior atenção primária e valorização destes trabalhadores. Entre nós, valorizar e participar de ações de solidariedade organizadas em redes de apoio mútuo para conter o atual cenário de contágio do COVID-19, campanhas de distribuição de testes, máscaras de proteção facial e outros EPIs para a população e para profissionais da saúde na linha de frente no combate à pandemia. Para ajudar na produção de máscaras e distribuição às pessoas, ateliês de costura e costureiras tem feito um excelente trabalho em produzi-las e muitas vezes de forma gratuita.

2) DISPENSA REMUNERADA E RENDA SOCIAL PERMANENTE

Garantia de dispensa do trabalho nas atividades não essenciais, sem demissões e nem redução salarial. Renda básica permanente de PELO MENOS 1 salário mínimo e meio para todos os trabalhadores, principalmente o povo da economia informal, desempregadas e desempregados, trabalhadoras e trabalhadores em condições precárias na rua como de entrega e serviços. Este valor ainda está muito abaixo do valor apontado pelo DIEESE, que é mais de R$ 4 mil mensais para sustentar dignamente uma família de 4 pessoas.

3) SUSPENSÃO DE CONTAS, DÍVIDAS E PENAS

Suspender aluguéis, dívidas, empréstimos e multas. Isenção de tarifas de serviços essenciais que afetam a vida dos mais pobres. Liberação das penas dos presos no regime semi-aberto e de quem não tem julgamento. A grande maioria de presas e presos é pobre e negra, sofrendo com o encarceramento em massa que mata diariamente, humilha familiares e aprofunda o genocídio do nosso povo.

4) DIREITO A MORADIA DIGNA

Solidariedade à população em situação de rua e sem-teto! Suspensão imediata de despejos ou ordens judiciais de reintegração de posse. Fazer cumprir a função social de edifícios vazios para fim de moradia digna e amparo a todas e todos. Subsídio de hoteis próximos a hospitais para profissionais da saúde para proteção de suas famílias. Se morar é um direito, ocupar é um dever!

5) ABASTECIMENTO POPULAR

Disponibilizar mantimentos da merenda escolar para consumo em casa. Prioridade aos serviços de abastecimento e tratamento comunitários de água e esgoto, bem como fornecimento de energia elétrica, ou seja, serviço ininterrupto aos locais sem possibibilidade de armazenamento. Possibilidade de uso das cozinhas escolares para a produção de marmitas a serem distribuídas àqueles sem acesso à condições de preparo.

6) INVESTIMENTO PÚBLICO E DIVISÃO DA RIQUEZA

Aumento dos investimentos públicos para as necessidades populares de saúde, renda, abastecimento e plano de economia popular para suprir as urgências sanitárias. Taxação das grandes fortunas, dos lucros e dividendos dos grandes empresários e fim do ajuste fiscal.

7) CONTRA O GENOCÍDIO DO POVO PRETO, POBRE E PERIFÉRICO

Contra as ditaduras e o poder de governar pela morte do povo. Pelo fim da criminalização e encarceramento sistemático da população preta e periférica, justificado pela falácia da guerra às drogas. A crise é permanente contra o povo preto e pobre, atingidos pela ausência de direitos, afetos e oportunidades. Vigiados pela naturalização racista da higienização social.

8) DIREITOS DOS POVOS ORIGINÁRIOS E POPULAÇÕES TRADICIONAIS

É preciso fortalecer as redes de solidariedade e apoio mútuo com indígenas, quilombolas e povos da mata e das águas, pois com o território espoliado fica prejudicada a autonomia alimentar, as práticas de cuidado e de atenção à saúde. Pela imediata demarcação das terras indígenas e titulação dos territórios quilombolas! Pelo fim do genocídio nos territórios tradicionais! Contra o aparelhamento da FUNAI pelo missionarismo neopentecostal, que busca catequizar as populações indígenas não contatadas, levando a Covid-19 e outras epidemias, como o vírus do colonialismo!

9) PARALISAÇÃO IMEDIATA DA MINERAÇÃO NO BRASIL

A mineração foi considerada atividade essencial pelo governo federal. A continuidade da extração mineral nesse modelo só importa para quem lucra em cima da exploração dos trabalhadores do setor, cujas vidas já eram colocadas em risco, em condições de extrema insalubridade antes da pandemia. Tal decisão é parte do projeto genocida neoliberal, para garantir os ganhos estratosféricos do capital industrial e financeiro ligado à extração mineral. Essencial é a vida do povo!

10) REFORMA AGRÁRIA POPULAR E A LUTA DO CAMPESINATO

Reforma agrária já! Direito à terra e à alimentação de qualidade para todos! Com a pandemia, ficou ainda mais evidente que quem garante o abastecimento das cidades são os pequenos produtores rurais, as trabalhadoras e trabalhadores da terra. Pelo fortalecimento dos movimentos sociais do campo, linha de frente da luta pela terra. Pelo fim dos assassinatos no campo, a mando do latifúndio e do agronegócio. A luta e a resistência campesina garantem a soberania alimentar de todo o povo em território brasileiro. Pelo fortalecimento dos vínculos e redes de apoio mútuo e solidariedade entre campo e cidade na luta por vida digna.

11) PELO FIM DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

O isolamento social traz para perto das mulheres seus agressores e dificilmente elas conseguem expor a situação. Além de conviver com o silêncio da violência são sobrecarregadas com o cuidado da casa e da família, o que afeta ainda mais sua condição psicológica. São as mulheres mais pobres que ocupam a linha de frente do atendimento à saúde e que se expõem como empregadas domésticas. Seja saindo de suas casas todos os dias ou em isolamento social, sobretudo mulheres pretas e periféricas, que sofrem as dores e o medo da morte mais de perto.

12) CONTRA O DESMONTE DA EDUCAÇÃO PÚBLICA

Na luta contra qualquer corte que se apresente no orçamento ou na estrutura da educação pública. Contra os ataques aos trabalhares e trabalhadoras da educação! Pela suspensão do calendário letivo de escolas, institutos e universidade de acordo com a continuidade do isolamento social. Contra a política neoliberal de implementação do EaD ou de atividades remotas no setor da educação pública, uma vez que a realidade do povo brasileiro não permite o acesso aos recursos necessários, em especial durante a pandemia. Pelo acesso e permanência de crianças e jovens à educação básica de qualidade. Em defesa dos estudantes do povo. Pelo fim do vestibular!

Assinam esta campanha:

– Ação Antifa M’Boigy (Mogi das Cruzes/SP)
– Alternativa Popular (Londrina/PR)
– Amigos da Terra Brasil
– ANTAR – Poder Popular e Antiespecista (RS)
– Articulação Libertária (Santa Maria/RS)
– Ateneu Libertário A Batalha da Várzea (Porto Alegre/RS)
– Autonomia e Luta (MT)
– Baque Mulher (Curitiba/PR)
– Centro de Cultura Social (Rio de Janeiro/RJ)
– Centro de Formação Saberes Ka’apor (MA)
– Clube de Mães da Periferia (Porto Alegre/RS)
– COLEP (Porto Alegre/RS)
– Coletivo Catarse (Porto Alegre/RS)
– Coletivo Mulheres em Movimento de Ananindeua (Ananindeua/PA)
– Coluna Vermelha (Porto Alegre/RS)
– CUAPI – Coletivo Urbano em Apoio aos Povos Indígenas (SP)
– Cursinho Comunitário Quebrando a Banca (Maceió/AL)
– Dandaras – Coletivo de Mulheres Negras (Santa Maria/RS)
– Escolinha Comunitária Elena Quinteros (Santa Maria/RS)
– Espaço Iraímas (Alegrete/RS)
– Grêmio Antifascista (Porto Alegre/RS)
– Guandu – Grupo de Agroecologia (Santa Maria/RS)
– Juventude Antifascista (Caxias do Sul/RS)
– Movimento de Organização de Base (MG)
– Movimento de Organização de Base (RJ)
– Movimento de Organização de Base (PR)
– Movimento de Organização de Base (PA)
– Movimento Passe Livre (Joinville/SC)
– Mulheres Resistem (AL)
– Mulheres Resistem (MT)
– Mulheres na Resistência (RJ)
– Mutirão – Grupo de Trabalhadores da Terra (RS)
– Núcleo Pró Movimento de Organização de Base (Mogi das Cruzes/SP)
– Núcleo Pró Movimento de Organização de Base Jardim Ângela (São Paulo/SP)
– Ocupação Vila Resistência (Santa Maria/RS)
– Pintelute (SC)
– Rádio Comunitária A Voz Do Morro (Porto Alegre/RS)
– Resistência Popular (AL)
– Repórter Popular
– Resistência Popular Estudantil (Florianópolis/SC)
– Resistência Popular Estudantil (Marília/SP)
– Resistência Popular Estudantil (Araraquara/SP)
– Resistência Popular Estudantil (RJ)
– Resistência Popular Estudantil (PR)
– Resistência Popular Sindical (PR)
– Resistência Popular (RS)
– SDV Reciclando (Porto Alegre/RS)
– Teatro Comunitário Vermelho Riu (Florianópolis/SC)
– Tod@s – Coletivo Libertário da Serra Gaúcha (Caxias do Sul/RS)
– Vila Boa Esperança (Porto Alegre/RS)

26 de maio de 2020

Se o seu coletivo, movimento ou associação quiser se somar à campanha, entre em contato com o Repórter Popular pelo WhatsApp (+5551989606682), Facebook (https://www.facebook.com/reporterpop/) ou Instagram (http://www.instagram.com/reporterpopular).

RP COMENTA: “Pandemia reduz submissões de artigos acadêmicos assinados por mulheres” (Revista Dados) 

 

Leia a notícia: http://dados.iesp.uerj.br/pandemia-reduz-submissoes-de-mulheres/

Segundo a revista acadêmica de ciências sociais Dados, o número de mulheres que submeteu artigos para a revista no segundo trimestre de 2020 é o menor desde 2016. Quando se considera textos com a primeira autora mulher, a revista afirma que embora a média desses manuscritos entre 2016 e o primeiro trimestre de 2020 tenha sido de 37%, esse patamar caiu para 13% neste trimestre.

A própria revista alerta que “esses dados são preliminares e demandam cautela analítica”, por se tratar de período inconcluso e envolver apenas uma revista. No entanto, é importante salientar como ela parece ser mais um dado num padrão de aprofundamento das desigualdades de gênero a partir da crise social provocada pela pandemia de Covid-19. Como apontamos em nossa série de textos, a crítica quanto à EaD se deve em parte à preocupação semelhante acerca dos efeitos distintos que sua implementação tem quanto a vários recortes sociais, o de gênero não sendo menos importante.

Como nossas companheiras da Resistência Popular Estudantil – RJ apontaram recentemente, “vivemos numa sociedade na qual o patriarcado é sustentado estruturalmente, fomentando a opressão de gênero e o machismo, ou seja, ser mulher é um grande desafio”. Nossa luta dentro nas estruturas acadêmicas e científicas passa por denunciar justamente as estruturas que, de maneira insidiosa e sutil, acumulam-se em distorções e injustiças ao longo do tempo.

RP COMENTA: “Laureate usa robôs no lugar de professores sem que alunos saibam” (Agência Pública)

Leia a notícia: https://apublica.org/2020/04/laureate-usa-robos-no-lugar-de-professores-sem-que-alunos-saibam/

Segundo denúncias obtidas pela Agência Pública, a rede de instituições de educação a distância (EaD) Laureate está usando um programa de computador (LTI) para corrigir atividades dissertativas de suas estudantes. Dirigentes proibiam que estudantes fossem informadas de que isso estava acontecendo – e não é difícil entender por quê: cheias de problemas, as correções automáticas não são capazes de refletir o real desempenho estudantil, e inclusive deixam passar plágios.

Esta notícia é um exemplo perfeito do que discutimos em nossas recentes análises sobre a EaD na pandemia: tecnologias como esta subvertem completamente o real significado da educação, privando as estudantes de um desenvolvimento mais adequado da relação com professoras no momento avaliativo. Além disso, prejudica também a perspectiva da classe trabalhadora docente, pois com o tempo o sistema será certamente “aperfeiçoado” para que engane as estudantes o suficiente para não gerar reclamações (não importando o que tenham aprendido, ou que tipo de profissionais e seres humanos serão). Absolutamente NINGUÉM ganha com isso, exceto os acionistas da empresa, que amplia seu poder no âmbito dos conglomerados educacionais privados. O fato de a medida ter sido escondida e aplicada em tempos de pandemia torna este projeto ainda mais cruel.

Como apontamos em nossa série de textos, é preciso ser crítico quanto à maneira como as tecnologias são apresentadas como soluções miraculosas, especialmente em tempos de crise. Através da naturalização da EaD e de nosso engajamento acrítico com ela, aprendemos que “educação” significa receber um depósito de conteúdo pronto isoladamente em nossas casas, gerenciando nossos próprios problemas de aprendizado usando ferramentas monopolizadas por empresas, sem buscar alternativas para a promoção de igualdade e solidariedade nesse processo. Isso não é educação a distância, mas tão somente distância: ficamos cada vez mais longes do mundo que deveríamos estar construindo no rastro de destruição que a pandemia deixa no tecido social.

Estudante é trabalhador(a)!

Tornou-se comum ouvirmos que as universidades públicas são espaços de playboy, daqueles que passam a vida em escolas privadas, que não precisam se preocupar com contas no final de mês e que tem empregados e roupas de marca. De tanto falarem isso muitas pessoas acabam acreditando e, até mesmo entre estudantes, existe quem caia nesse conto do vigário.

Na realidade a situação dos e das estudantes evidencia que somos uma maioria de pobres, com 53,54% de nossas famílias tendo renda de até 1 salário mínimo per capita. Razão pela qual 70,5% de nós trabalhamos ou estamos à procura de trabalho. E quando encontramos um trabalho, ele é sem direitos em grande parte dos casos (44,4%), seja em um subemprego ou em um estágio sub-remunerado. E é através destes trabalhos cada vez mais precarizados que colocamos comida na mesa, pagamos aluguéis, cobrimos gastos com luz e água vendo nosso suor diário ser levado por preços cada vez mais altos nos supermercados, nas tarifas de contas e nos ajustes arbitrários das imobiliárias. Esse processo de elevação dos preços – chamado de carestia da vida – pesa principalmente sobre os 37,8% de nós que somos o sustento de nossas famílias, mas também mostra seus duros efeitos sobre os milhares que “chegam junto” para ajudar nas despesas familiares. É também importante ressalvar que 52,1% dos estudantes de universidades públicas somos autodeclarados pretos, pardos e indígenas, ou seja, somos pertencentes dos grupos étnico-raciais que “herdaram” a chibata nas costas que deixou a marca da desigualdade social e da miséria cada vez mais elevada.

A entrada das e dos de baixo ainda tem muito que avançar. Nós pobres ainda somos as/os mais prejudicadas/os com o ENEM e somos as/os que mais desistem dos cursos universitários devido à falta de bolsas que não suprem de forma adequada as nossas necessidades básicas; também somos as/os últimas/os a ter acesso às creches universitárias (quando elas existem) e as/os mais empurradas/os para os subempregos. Mas com os dados do nosso perfil fica evidente que a história de “universidade pública ser de playboy” é balela, das mais mentirosas, inventada por quem quer cortar ainda mais as creches universitárias, as bolsas, as pesquisas, as oportunidades.

Desta forma, não basta criar a mentira que diz que “estudantes não são trabalhadores e trabalhadores”. Com a necessidade crescente de estudantes por trabalho para sobreviver e continuar seus estudos, eles inventam uma nova mentira: “o empreendedor de si”, seja para estimular a PJotização que retira direitos trabalhistas ou mesmo para vender que trabalhar em aplicativos de transporte e entrega de alimentos, vender doces nas universidades, revender cosméticos e afins é “investir em si mesmo”, se fazendo livre das “amarras de velhas relações de trabalho”.

Neste 1º de Maio, data histórica da nossa classe, forjada na luta de trabalhadores e trabalhadoras em defesa de uma jornada de trabalho de 8 horas, melhores condições de trabalho e pelo fim do trabalho infantil, devemos combater todas as mentiras que queiram mascarar a nossa realidade.

Somos estudantes pobres, portanto exigimos assistência e permanência estudantil; ao passo que também somos trabalhadores e trabalhadoras, portanto exigimos direito à aposentadoria, condições de trabalho e vida digna.

Somos trabalhadores e trabalhadoras pois temos que nos submeter aos bicos mal-remunerados, a trocar horas de estudo por horas produzindo as comidas que venderemos nas universidades e ruas, pois nos arriscamos nos aplicativos de transporte e entrega para gerar lucro de um patrão que nem vemos. Mesmo na pós-graduação, a situação também é essa, somos as e os trabalhadores responsáveis pelos avanços científicos necessários ao enfrentamento dos problemas sociais, como a criação de respiradores para os atingidos pelo novo coronavírus, mas não temos acesso a direitos trabalhistas, regulamentação do trabalho, ficamos submetidos ao produtivismo das agências fomentadoras. E por não sermos entendidos como trabalhadores pelo governo, ficamos relegados a não ter contribuição previdenciária e nossos rendimentos não serem salários, mas sim bolsas que não recebem correção anual.

Somos filhos e filhas de trabalhadores e trabalhadoras, e em muitos casos, somos pais e mães estudantes. Diante do cenário de crise que atravessamos, de retirada de direitos, de aumento dos preços e da violência policial temos por tarefa unir forças com as categorias e setores que se levantam e se colocam em luta, para garantir nosso direito à quarentena sem perda de direitos e com salários integrais, investimentos em saneamento e saúde, a suspensão da EC95 (antiga PEC do Teto dos Gastos que congelou, por 20 anos, os investimentos públicos). E, quando do retorno das atividades, a tarefa será construir piquetes e barricadas rumo a uma greve geral de base, sem depositar nenhuma ilusão nas eleições.

É com a ideia de debatermos mais a fundo as armadilhas dos inimigos, bem como as saídas que devemos apontar para a crise que nós convidamos você para a live “Estudante é trabalhador(a)” que ocorrerá no dia 08/05/2020 às 18:00. Aqui mesmo no facebook através das nossas páginas.

1º de maio é dia do/a trabalhador/a, é dia de luta!
Estudante é trabalhador/a!
Estudante é resistência na LUTA por VIDA DIGNA!
Que os de cima paguem pela PANDEMIA!

EaD não é a solução durante a pandemia

Publicamos a série abaixo em três textos no site Repórter Popular. Aqui, incluímos os três textos na mesma postagem, pois fazem parte de uma mesma análise crítica do uso da EaD, em especial no momento da pandemia.


EaD não é a solução durante a pandemia: o determinismo da tecnologia e o uso de nossos dados

Na medida em que a pandemia avançou, e com vistas a fortalecer o distanciamento social, instituições de ensino de todo o país suspenderam suas atividades presenciais. No entanto, muitas delas vêm buscando ou implementando alternativas para o funcionamento a distância.

Muitas pessoas presumem que as tecnologias digitais e o ambiente virtual permitem realizar atividades da mesma forma que presencialmente. Nas últimas décadas, afinal, tantas coisas que fazíamos em papel ou pessoalmente passamos a fazer digitando em computadores ou celulares no sofá de casa. Por que seria diferente com a educação? Ela já não vem funcionando dessa forma em muitos lugares?

São várias as razões pelas quais educação e distância não combinam. Com esta série de textos, nos propomos a discutir criticamente a Educação a Distância (EaD), pois não podemos deixar que, neste momento, em que estamos todas fora dos eixos de algum modo, nos vendam como um futuro inevitável o que é na verdade uma péssima solução para os problemas da educação e, no fim das contas, das nossas vidas.

No primeiro texto, discutimos a origem e a história da EaD, o tecnicismo e a crença no progresso tecnológico por trás do otimismo atual, além dos impactos e implicações de migrar nossas salas de aula para a infraestrutura da Google, uma mega-empresa que vive de coletar e vender nossos dados. No segundo texto, discutimos consequências da adesão à EaD em nossas instituições de ensino, como a precarização do trabalho, redução da qualidade do ensino e aprofundamento do abismo de desigualdade entre as escolas privadas e a juventude pobre. No terceiro texto, discutimos a concepção de educação por trás da EaD e o que acreditamos ser o papel das escolas e universidades em meio à pandemia, na defesa de uma vida digna para todas. Os textos serão publicados, um por dia, aqui no Repórter Popular.

De onde vem a EaD?

Algumas pesquisadoras da área dizem que a origem histórica da educação a distância se deu com as cartas de Paulo a comunidades da Ásia menor, na tentativa de cristianizá-las em meados do século I. Outras enxergam a origem na invenção da imprensa de Gutemberg, no século XV, sendo a possibilidade de produção de livros em maior escala como um marco para a EaD. É seguro dizer que estas perspectivas sofrem do que chamamos de anacronismo: atribuir (erroneamente) ao passado conceitos modernos. Nesse caso, o anacronismo acaba sendo uma forma de naturalização – fazer crer que a EaD é algo que sempre “esteve aí”, em vez de ser algo construído pelas pessoas em um contexto específico.

A despeito da controvérsia, o início de cursos de línguas via correspondência na Europa do Século XIX é um marco mais comumente aceito para o início da educação a distância. Desta forma, o histórico da EaD se relaciona aos avanços nas tecnologias de informação e comunicação, passando pelos serviços postais nacionais, o rádio e posteriormente a televisão, chegando às novas tecnologias de informação e comunicação que temos hoje, estas últimas permitindo a massificação da EaD.

Quando pensamos no caso brasileiro, a EaD surge primeiramente em 1904 por iniciativa estadunidense através de cursos por correspondência. É só a partir dos anos 30, no entanto, que ela cresce com mais força, com foco no ensino profissionalizante. Um grande estusiasta dessa modalidade foi Edgard Roquette-Pinto, considerado pai da rádio-difusão no país e também ligado a pautas eugenistas na época. A EaD então funcionava como alternativa especialmente na âmbito da educação não formal. Ela passou a ser utilizada sob a justificativa de tornar o conhecimento acessível às pessoas que residiam em áreas isoladas ou sem condições de cursar o ensino regular no período normal, como pretendeu Darcy Ribeiro, outro grande entusiasta da modalidade e que contribuiu na sua consolidação na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB 9394/96).

A EaD é inevitável?

Não é por acaso que a EaD pareça para tantas pessoas, em especial fora do campo da Educação, uma solução milagrosa. Um entre tantos exemplos foi dado pelo divulgador científico Átila Iamarino, que apontou o crescimento da EaD na educação como uma provável mudança positiva da sociedade pós-pandemia. Isso é resultado de uma concepção equivocada do que é a tecnologia, como se seu avanço fosse linear, inescapável; como se só pudesse caminhar nessa exata direção que vem tomando, e como se toda tecnologia viesse para o progresso e a melhoria da vida. É justo esse otimismo tecnológico? 

Enriquecimento de urânio, escavação do pré-sal, plantas transgênicas cujas sementes não podem ser replantadas, celulares com geolocalização por GPS, vacinas e medicamentos contra doenças tropicais… quais recebem prioridade e investimento? Quem se beneficia de umas e de outras? Quem decide sobre seu uso?

A tecnologia que chega a ser produzida é o resultado da correlação de forças e interesses por trás da produção científica, industrial, das políticas públicas e das previsões do mercado. Se o capitalismo é o modelo de sociedade em que o capital fala mais alto, as tecnologias produzidas nele servirão acima de tudo ao capital, ao aumento das taxas de lucro e redução de custos. Isso não significa dizer que a tecnologia vá sempre ser negativa e que devemos abandoná-la, pelo contrário. Significa entender como ela tem grande potencial de impactar a sociedade e mudar seus rumos. Precisamos criticar as tecnologias existentes como passo para disputar a produção de tecnologias que sirvam às classes oprimidas!

Afirmar isso em um contexto de avanço da EaD significa questionar a quem as tecnologias digitais no meio educacional estão servindo e com que propósitos. Temos hoje a empresa brasileira Cogna (antiga Kroton) como a maior do ramo educacional no mundo e a realidade de mais vagas em instituições de ensino superior para a modalidade EaD do que a presencial no país. O que está em jogo, afinal?

É importante lembrar que muitas daquelas que agora defendem que a educação não pode parar e que as aulas online são fundamentais não disseram nada quando o Governo Federal acabou com a TV Escola, uma importante iniciativa pública que produzia bons materiais e conteúdos auxiliares, atuando como um complemento à distância para a formação. Qual é a verdadeira preocupação então?

A Google vê na pandemia uma oportunidade

Quem aparece neste momento como alternativa para efetivar a educação a distância não são as estruturas públicas, mas iniciativas como o Google for Education. A rede estadual de Santa Catarina é um grande exemplo: após um acordo experimental em 2016, aplicado em poucas escolas, agora todas as escolas do estado estão sendo forçadas a realizar educação online através das ferramentas da empresa. Sem oferecer formação prévia, sem disponibilizar equipamentos adequados às professoras, muito menos às estudantes e suas famílias.

Há, no entanto, outro problema igualmente sério, mas pouco discutido, que é a quantidade massiva de dados pessoais que serão entregues à empresa mais valiosa do mundo – cujo lucro vem, exatamente, de explorar nossos dados e vendê-los para quem pagar melhor. Quais as possíveis consequências de oferecer à Google todos esses dados de milhões de estudantes?

Estes dados incluem nome, idade, endereço, equipamentos digitais de acesso (computadores e celulares), mas também seus saberes, dúvidas, ritmos de aprendizado, interesses, e interações sociais. Tudo que é feito nas plataformas da Google é monitorado e salvo para montar perfis pessoais aprofundados, que servirão para fazer marketing personalizado, políticas públicas de comportamento de massas, campanhas eleitorais, entre outras possibilidades que ainda não entendemos plenamente. Estamos colocando um conjunto de bilionários bisbilhotando cada passo da educação de cada um de nossos jovens!

A EaD é uma tecnologia que deve ser pensada criticamente, e se a forma técnica de sua implementação atual está sendo problemática, esta é apenas a ponta da geleira. Nos próximos textos, discutiremos outros efeitos da expansão da EaD na última década e como ela acaba se distanciando de uma ideia de educação aliada a uma vida digna.


EaD não é a solução durante a pandemia: precarização do ensino e o abismo da desigualdade

Por Resistência Popular Estudantil – Floripa

Este é o segundo texto de uma série sobre a Educação a Distância (EaD). No primeiro, relatamos a origem e a história da EaD, analisando o tecnicismo e a crença no progresso tecnológico por trás do otimismo atual, além dos impactos e implicações de migrar nossas salas de aula para infraestruturas privadas (como a da Google, uma mega-empresa que vive de coletar e vender nossos dados). Hoje, falaremos sobre os resultados de aderir à EaD em nossas instituições de ensino, como a precarização do trabalho, redução da qualidade do ensino e aprofundamento do abismo de desigualdade entre as escolas privadas e a juventude pobre.

Para onde a EaD tem levado

O avanço da EaD no ensino superior mostra-se mais acentuado quando o assunto é formação docente. Cursos de Pedagogia e Licenciaturas recebem o dobro de matrículas em comparação a demais áreas do ensino superior, e a rede privada é a que mais forma professoras hoje, mais da metade delas na modalidade a distância. Muitos desses cursos oferecem formação rápida para ingresso acelerado no mercado de trabalho, que para estas profissionais já se apresenta bastante precarizado, e vem consolidando uma indústria de cursos online para baratear os custos de formação.

O que se percebe é um sistema educacional que se torna cada dia mais perverso. O mercado forma professoras em EaD de modo apressado e pouco crítico, gestoras se aproveitam do mesmo discurso hegemônico de uso de tecnologias digitais como resposta para demandas atuais de ensino, e as trabalhadoras da educação acabam impedidas de realizar um processo educativo que considere cada contexto e realidade social, além de abordar outras dimensões para além da reprodução conteudista.

Trabalhando muito e ganhando pouco por isso, essas profissionais vêem seu trabalho se esvaziar de sentido, o que se reflete nas estudantes, que não vêem nos conhecimentos apresentados formas de lidar com situações de sofrimento e de transformar suas vidas. Isso também resulta em futuras profissionais reprodutoras de um sistema que as explora. A profissão passa a ser pouco desejada e buscada apenas pela facilidade de formação e ingresso no mercado de trabalho, mas a precarização do serviço e da formação faz com que sua ação pedagógica esteja cada vez mais afastada daquela que é realmente necessária.

Isso sem falar na realidade brasileira de desobrigação de formação pedagógica para atuação docente em instituições privadas, onde, para lecionar cursos EaD, são desejáveis apenas características como “inovação”, “adaptação”, “inteligência pessoal e emocional”, entre outras que fogem aos aspectos relacionais e de contexto, tão essenciais para a atuação profissional docente coerente e comprometida com os sujeitos da ação pedagógica. O cenário que se mostra é o de professoras com formação duvidosa trabalhando em condições precárias e (de)formando pessoas para o mercado de trabalho. Onde foi parar a democratização da educação?

A EaD como solução de emergência

Utilizada para tentar manter uma “normalidade” diante da pandemia, a EaD tem sido um desastre em vários níveis. Em vários casos, ela se resume a “atividades” sem contexto que estudantes deveriam desenvolver de forma “autônoma”. Em outros, ela se trata das mesmas aulas de sempre, só que transmitidas ao vivo. O problema é que estes últimos casos só costumam ocorrer onde há recursos, sejam eles financeiros, humanos e/ou tecnológicos. No caso do sistema público de educação, a falta de recursos não está só do lado da infrastrutura pública sucateada, mas também das próprias estudantes, que muitas vezes não têm acesso à internet ou, se têm, é precário ou exclusivamente através de celulares (que estão longe de serem dispositivos ideais para estudar). Muitas trabalhadoras da educação com frequência não têm treinamento adequado para o uso dessas ferramentas, e agora estão sendo cobradas para que as aprendam a toque de caixa.

Pode até parecer que com “recursos” a EaD poderia substituir a educação presencial. Mas este não é o caso. Muitas universidades citam aulas em laboratório como situações em que é impeditivo realizar educação a distância; na educação básica, o exemplo mais vívido talvez seja o da educação física. Não dá para abstrair os corpos dos sujeitos da educação como se fossem arquivos em uma “nuvem” digital, especialmente no contexto em que vivemos. Assim como Restaurantes Universitários fornecem alimentação adequada e acessível, imprescindível para a permanência de tantas estudantes, sabe-se o papel essencial das merendas escolares para muitas estudantes e suas famílias. Estudantes que, aliás, sentem o estresse de ver no domicílio uma prisão, a ansiedade de ouvir estatísticas obituárias cada vez maiores todos os dias, o peso de perder familiares, de lidar com o medo do endividamento, do despejo, da fome. Há ainda algumas cujas casas sequer são lares, mas ambientes de abuso e falta de perspectiva em vez de acolhimento.

Dessa forma, a manutenção das aulas online em uma falsa normalidade faz mais do que precarizar o ensino. Ela aprofunda o abismo da desigualdade existente por toda a falta de condições materiais na maioria dos lares do país. Mais do que os conteúdos, em si, é o convívio com a estrutura da escola e com as suas trabalhadoras que permite enfrentar muitas dessas ausências, conhecer as dificuldades de cada pessoa, pensar em acessibilidade, em oferecer vislumbres de um mundo mais amplo do que aquele visto dentro de casa. Ao contrário do empresariado da educação, que precisa manter as coisas em funcionamento porque só estão pensando na garantia de seus lucros, nós dizemos que não: nenhuma criança e jovem pode ser deixada para trás!

O que significa não deixá-las para trás? No próximo texto, discutiremos a concepção de educação por trás da EaD e o que acreditamos ser o papel das escolas e universidades em meio à pandemia, na defesa de uma vida digna para todas. Os textos da série serão publicados, um por dia, aqui no Repórter Popular.


EaD não é a solução durante a pandemia: o sentido da educação e a luta por uma vida digna

Este é o terceiro texto de uma série sobre a Educação a Distância (EaD). No primeiro, relatamos a origem e a história da EaD, analisando o tecnicismo e a crença no progresso tecnológico por trás do otimismo atual, além dos impactos e implicações de migrar nossas salas de aula para infraestruturas privadas (como a da Google, uma mega-empresa que vive de coletar e vender nossos dados). No segundo, discutimos consequências da adesão à EaD em nossas instituições de ensino, como a precarização do trabalho, redução da qualidade do ensino e aprofundamento do abismo de desigualdade entre as escolas privadas e a juventude pobre. Nesta parte final, discutimos a concepção de educação por trás da EaD e o que acreditamos ser o papel das escolas e universidades em meio à pandemia, na defesa de uma vida digna para todas.

“Educação” a distância?

A partir do que foi discutido em nosso primeiro texto, sobre a história da EaD, é possível entender por que ela já foi celebrada como “democratização”. O que ela faz ao levar conhecimento técnico onde este é de difícil acesso é certamente louvável. Ela ultrapassa não só barreiras geográficas como as de outros tipos, possibilitando que muitas trabalhadoras, mesmo em centros urbanos, consigam obter educação formal e melhorar suas vidas. Mas é realmente a “educação” que a EaD democratiza?

Comparar as cartas de Paulo do século I à EaD é mais que tentar naturalizar esta última: é dizer que evangelizar é o mesmo que educar. Mas educar é muito mais: é preparar para a vida, o que vale tanto para crianças quanto para a educação que buscam pessoas adultas. A vida não é só o que fazemos com corpos e objetos, mas também umas com as outras, enquanto sociedade. Toda educação ensina alguma coisa “técnica”, mas também socializa é um modelo prático de relações entre as pessoas.

Evangelizar é propagar uma ideia pronta, mas a sociedade que queremos é uma em que as pessoas convivam entre diferentes perspectivas. Para isso é preciso aprender a ouvir, analisar, dialogar, argumentar e chegar a acordos. Não estamos falando só de educação como fenômeno político – como algo que fomenta o convívio entre as pessoas, que embasa a democracia – mas da própria produção de conhecimento científico. Conhecimento de verdade é o que se põe à prova, que pode ser e é criticado. A educação exige debate, desafio; (con)vivências que nos causem estranhamento, seja na física ou no estudo de línguas, na biologia, na história. Na educação básica, trata-se de ampliar os horizontes de quem, de outro modo, poderia crescer confinada aos muros de uma tradição conformista; na superior, de produzir e transmitir não só as conclusões às quais outras pessoas já chegaram, mas o próprio raciocínio pra chegar a novas conclusões. Enfatizamos que o aspecto coletivo e social deste processo é uma de suas características mais essenciais. Não importa o quanto textos, vídeos e aparelhos estejam na mediação do processo de aprendizado, este se dá pela interação humana acima de tudo.

É isto que entende por educação quem defende a Educação a Distância e a “democratização” com ela promovida? Provavelmente não. A EaD pode ser fundamental para democratizar a “instrução”, tanto quanto o Youtube permite que pessoas possam aprender a consertar seus próprios computadores ou o SciHub leva artigos acadêmicos para pessoas que não poderiam pagar por eles talvez daí a tendência ao anacronismo que vimos no primeiro texto: qualquer transmissão de “dados” à distância pode ser reinterpretada como EaD! É obviamente benéfico que certos tipos de instrução cheguem onde faz falta, mas isso não substitui um espaço coletivo dedicado à aprendizagem. A EaD pode democratizar também as “credenciais”, isto é, diplomas e certificados que abrem portas num mercado de trabalho competitivo. Porém, esse “credencialismo” – em que remuneração tem mais a ver com diferenças socioculturais entre classess do que com a utilidade e a onerosidade do trabalho – também precisa ser criticado, especialmente porque afunda a classe trabalhadora em dívidas sem lhes oferecer a real experiência de uma educação superior como local de debate crítico, formação, de produção do conhecimento e de extensão a partir das demandas da sociedade, para além da formação que o mercado quer de nós. 

Sabemos que o modelo escolar predominante hoje tampouco conduz a essa definição de educação. Inúmeras escolas dizem “preparar para a vida”, mas isso frequentemente implica reproduzir a sociedade como ela é, com todas as suas mazelas. Mesmo quando o modelo de educação autoritário e industrial é subvertido, é para atender aos interesses de mercado: as elites querem que aprendamos todas a sermos “resilientes”, “flexíveis”, “empreendedoras” e “emocionalmente inteligentes”. Em outras palavras, que nos vejamos como agentes do mercado, nos adaptemos às decisões que as elites tomam, soframos os problemas sociais sem entender que são sociais. É a luta cotidiana das trabalhadoras nas escolas públicas – e também em algumas particulares – que torna a educação muito mais do que essa instrução técnica, uma educação que cria novas relações sociais e abre brechas para o conhecimento crítico que pode transformar a realidade. 

Quando o Fórum Econômico Mundial argumenta a favor da EaD, não apenas temporariamente mas como um “legado” da pandemia para a educação do futuro, sabemos que essa modalidade de educação promove valores que vão na contramão da sociedade que queremos construir. Através da naturalização da EaD e de nosso engajamento acrítico com ela, aprendemos que “educação” significa receber um depósito de conteúdo pronto isoladamente em nossas casas, gerenciando nossos próprios problemas de aprendizado usando ferramentas monopolizadas por empresas, sem buscar alternativas para a promoção de igualdade e solidariedade nesse processo. Isso não é educação a distância, mas tão somente distância: ficamos cada vez mais longes do mundo que deveríamos estar construindo no rastro de destruição que a pandemia deixa no tecido social.

Educação e vida digna

Durante a pandemia, a vida das pessoas, sobretudo da classe trabalhadora e dos outros setores oprimidos, está em risco. Não é só o vírus que enfrentamos, mas a diminuição da renda que afeta as condições materiais do povo. A pandemia só agravou uma crise anterior, de extrema precarização das nossas vidas aqui de baixo, com um aumento de custos das coisas mais básicas, como arroz, feijão, ônibus e aluguel, fora a política intensa de ataques aos direitos trabalhistas. Só cresce o número de trabalhadoras informais e o desemprego. Estamos sem um horizonte de vida digna, seja antes ou após a pandemia.

Nesse contexto, precisamos olhar para os currículos e entender que os conteúdos são apenas parte do que é função da escola ou da universidade. Sem comida no prato, fica difícil pensar no conteúdo perdido ou aquele que deve ser vencido online. As escolas e universidades públicas nesse momento podem ser espaços que atenuem os efeitos da pandemia e busquem garantir condições mais dignas para resistir a esse momento, através da distribuição de alimento e outros recursos, oferecendo seu espaço físico para uso dos órgãos de saúde e também permitindo que as professoras possam contribuir nesse momento em ações de apoio mútuo, não em planejamento de aulas. Sabemos que nossas escolas sempre foram porta de acesso para outros direitos sociais em nossas comunidades: local de informação e mobilização para vacinação, campanhas de saúde, políticas de assistência social, defesa dos direitos das crianças e das mulheres em casos de abuso, em muitos casos também um ponto de ajuda mútua onde as comunidades se organizam durante emergências e catástrofes. Nossas instituições de ensino devem pensar antes de tudo em nossas comunidades.

Além disso, pensar a EaD como nossa única chance de democratização de uma educação a algumas localidades e situações limita muito nossos sonhos sobre outro mundo. Temos que nos permitir sonhar por uma educação do tempo, em que todas aquelas com interesse e vontade de aprender possam ter a oportunidade para se demorar naquilo, sem ter a preocupação encaixotando sua vontade e seu direito a uma noite livre dentro da agenda cansativa da classe trabalhadora. Precisamos sonhar uma educação interiorizada, que chegue nos assentamentos e acampamentos da reforma agrária, quilombos e aldeias, em cada comunidade com o interesse de ter em seu território uma instituição pública de ensino. Nesse modelo, não é a cidade que oferece o ensino de longe a partir de uma realidade outra, mas a educação se dá de forma territorializada, fincada no chão em que brota como troca e a escola como um espaço de socialização, não mera transmissão de dados. É preciso sonhar e é preciso lutar cotidianamente para construir o projeto de educação que queremos para os povos oprimidos, sem o qual não existe vida digna!

RP COMENTA: “Empresas de ônibus da Grande Florianópolis suspendem contratos por dois meses” (ND+)

Leia a notícia: https://ndmais.com.br/noticias/empresas-de-onibus-da-grande-florianopolis-suspendem-contratos-por-dois-meses/

Com as medidas de isolamento social tomadas pelo governo do estado de Santa Catarina e a prefeitura de Florianópolis, o transporte público na Grande Florianópolis está suspenso desde 18 de março. Os ônibus na região são do Consórcio Fênix (Canasvieiras, Emflotur, Estrela, Transol e Insular) e também das empresas Jotur, Biguaçu e Imperatriz, nomes conhecidos daquelas que lutam contra o monopólio do sistema público de transporte – em 2014, a Consórcio Fênix ganhou licitação para atuar por 20 anos no transporte da cidade. A suspensão do contrato afetará milhares de trabalhadoras em um momento de pandemia e crise social. 

A suspensão tem como base a MP 936, medida com força de lei instituída pelo presidente Bolsonaro, que prevê suspensão dos contratos por parte dos patrões por até 60 dias ou dimunuição da carga horária de trabalho, com consequente perda salarial para a trabalhadora. O Estado se responsabiliza por pagar os salários daquelas que tinham o direito de continuar empregadas, para livrar os ricos de pagarem pela pandemia. É o patrão enchendo o bolso, enquanto os pobres mendigam por uma renda mínima pra passar por essa pandemia. Lembrando ainda que a MP tem como base não o salário pago pelo patrão à trabalhadora, o Estado calcula sobre o valor que pagaria em seguro-desemprego, o que pode acarretar uma diminuição da renda das trabalhadoras. Segundo cálculo por DIEESE, um salário de R$1500, cerca de um salário mínimo e meio, cai para $1290 com a suspensão do contrato – levando em conta que as empresas de ônibus se encaixam na categoria de empresas com receita anual maior que 4,8 milhões de reais. 

Muitos patrões têm se utilizado dos benefícios que a MP traz para os de cima. Luciano Hang, dono da rede de lojas HAVAN, suspendeu o contrato de 11 mil funcionárias. Já a Catarinense, companhia de ônibus intermunicipal e estadual, fez a suspensão de forma unilateral, sem diálogo com a categoria ou com o sindicato. Os custos do repasse de pagamento salarial, que sai da responsabilidade do patrão por dois meses e passa para o poder público, serão de dezenas de bilhões de reais por todo o país.

No caso das companhias de transporte da Grande Florianópolis, assim como é o caso da Havan, trata-se de empresas com lucros anuais altos. Como estudantes, vivemos anualmente o drama do aumento da tarifa, como se fosse já um ritual de ano novo e sempre sob a justificativa de prejuízo por parte das empresas, como se os donos fossem bons samaritanos oferencendo transporte público à cidade. A tarifa aumenta e o lucro dessas empresas se mantém constante. Há vários episódios de nossa história de luta em Florianópolis mostrando a digna raiva do povo contra essa equação, como as Revoltas da Catraca (2004 e 2005) e as Jornadas de Junho (2013). 

A suspensão dos contratos das trabalhadoras do transporte público da Grande Florianópolis reflete o caráter dessa MP, que diminui a renda de muitas trabalhadoras enquanto alivia o bolso do patrão. O que é necessário é uma renda mínima universal de um salário mínimo a milhões de brasileiras em trabalhos informais ou em situação de desemprego. Para aquelas contratadas, faz-se necessário que os patrões arquem com a crise e abram mão de seu lucro astronômico. Durante a pandemia que vivemos, que demanda alto investimento do Estado para garantir a vida das classes mais vulneráveis, é necessário que os mais ricos sejam taxados, sem condições de ampliar seu lucro ou minimizar perdas que não fazem cócegas em contas milionárias. É necessário lutar por vida digna para as nossas e combater o lucro dos patrões! 

Como estudantes e usuárias do transporte público, saudamos motoristas e cobradoras, categoria que deve permanecer em isolamento social. Com o alto fluxo de passageiras, o retorno do transporte público não pode ser uma possibilidade durante o combate à pandemia, pelo impacto que isso pode causar em toda a população e a super exposição dessas trabalhadoras. 

QUE OS RICOS PAGUEM PELA PANDEMIA!

Acompanhar também é lutar!

Não era novidade para ninguém que nos submetermos à um isolamento social traria consequências psicológicas para todos. Nas primeiras semanas de quarentena já era possível ver posts na internet de tom jocoso que sugeriam que no décimo dia de quarentena já estaríamos fora de nós mesmos. Tudo isso não é por o acaso; nascidos em uma sociedade em que somos serventes do mercado, portanto, da produção constante, a sensação de estarmos presos em casa, sozinhos, ou mesmo com outras (poucas) pessoas (família, amigos, companheiros), até nossos hobbies se tornam motivos de auto cobrança, pois não estamos fazendo “nada”, sem poder viver nossa vida ordinária, ou momentos de lazer com colegas – o que já parecia motivo de alarme para grande parte da população.

Imagine então uma situação piorada, que é a que a camada popular brasileira se encontra atualmente, em que não só perdemos as atividades e tarefas no exterior de nossas casas, mas estamos a beira de um colapso, com o aumento do desemprego, trabalhadores tendo que furar a quarentena para garantir seu sustento, estudantes sem o amparo devido da universidade – em sua maioria sendo obrigados a fazer atividades avaliativas à distância mesmo sem acesso à internet ou com problemas de saúde na família, com um presidente e governadores que ao invés de diminuir a perda de vidas preferem diminuir a perda de lucro das empresas, com os preços do mercado aumentando já que existe alta procura e baixa produção – e o preço tem que subir para conservar o lucro (mais uma vez o lucro à frente da vida), com moradores sem informação de como se prevenir – utilizando mascará, álcool em gel e papel higiênico (?) de forma indevida, com uma parte dos cidadãos se baseando em calúnias e notícias falsas sobre o corona vírus, e a eterna sensação de olhar pela janela sem saber quando ou, até mesmo, se as coisas voltarão à ser como antes. Sem contar outras situações mais precárias, como por exemplo; pessoas que nem onde morar tem para poder realizar a quarentena. E ai, como fica o Brasil?

Antes de todo esse caos nos atormentar, quantos de nós já não tínhamos sofrido, ou já sofríamos de ansiedade e depressão?! Podemos dizer que o século XXI é o século em que estes transtornos crescem a cada segundo. Junto com esse fator, vemos crescer também a patologização da vida, que comprime os problemas sociais, coletivos e do Estado ao indivíduo; como dizer que o que estamos vivenciando em relação à pandemia, desde o contágio do COVID-19, até os problemas de saúde mental se potencializando, não se refere também, até certa perspectiva, à essa crise social que estamos vivenciando, isentando o aspecto político dessa abordagem.

Não podemos perder de vista todos esses apontamentos e principalmente ter a compreensão de que companheiros e companheiras que estão na luta também estão aptos de sofrer e ter crises psicológicas por conta da conjuntura atual e problemas pessoais, desde de sua vida privada, tendo que suportar a quarentena (que como já dito, para a camada popular a vida em isolamento social adquire outro caráter), até aqueles que não tem condições de se manter em isolados por conta de emprego (dobrando os riscos de contágio e o desespero em torno de toda essa calamidade).

Por isso ressaltamos a importância de construirmos redes de apoio mútuo e solidariedade entre nós, desde grupos para realizar atividades de lazer à distancia para ajudar os companheiros e companheiras à se recompor, até redes para arrecadar alimento e utensílios básicos a aqueles que não estão conseguindo se manter financeiramente. Precisamos urgentemente estar ao lado dos explorados, acompanhando-os e auxíliando-os à levantar e permanecer em luta.

SOLIDARIEDADE E APOIO MÚTUO NO ENFRENTAMENTO DA PANDEMIA!

Resistência Popular Estudantil – Floripa
Resistência Popular Estudantil – Marília
Resistência Popular Estudantil – RJ

1,2 Tri para os bancos, míseros 600 reais para os pobres

Lucro indo para os bancos e prejuízo para os pobres. A degradação das condições de vida representada pelo aumento dos preços e pelo aprofundamento da violência de Estado segue a passos largos liquidando as possibilidades de sobrevivência e vida digna do povo brasileiro, deixando o viver mais difícil a cada dia.

Descendo no buraco desde pelo menos 2011, os ricos puxam a economia brasileira em sua queda, que vai chegando ao fundo do poço cada vez mais rápido agora com o problema do corona vírus. Como podemos ver, da maneira que é recorrente na história do capitalismo, o Estado agora surge para lançar a corda até o fundo do poço para salvar apenas a burguesia parasitária, mostrando que o “Estado mínimo” defendido pelos liberais, é para os pobres apenas. Enquanto isso, nós, os de baixo, continuaremos a sobreviver (ou morrer) no fundo deste poço; vendo cada vez mais a corda de nossa salvação para uma vida digna sendo cortada pelo mesmo Estado.

Saiamos agora do campo das metáforas e olhemos para a realidade concreta. Em poucos dias de crise, sem nenhum tipo de hesitação, a equipe econômica do governo Bolsonaro liberou cerca de 1,2 trilhões de reais, o equivalente a 16,7% do PIB (1), para as instituições financeiras (no Brasil, basicamente: Itaú, Bradesco e Santander). Segundo o presidente do Banco Central, essa medida tinha como objetivo “injetar liquidez” e “fazer caixa” para essas instituições. Ainda assim, o fato mais desumano e cruel dessa medida não se apresenta nela em si mesma, mas sim na não exigência de nenhum tipo de contrapartida social por esses sanguessugas, isto é, na não exigência de qualquer medida de afrouxamento de cobrança de juros e renegociação da dívida, para população mais pobre e endividada (segundo pesquisa realizada em dezembro de 2019, o percentual de famílias endividadas no Brasil bateu recorde com 66% ) (2), por exemplo. A corda lançada aos banqueiros nunca esteve tão firme e resistente.

Por outro lado, quando o assunto é salvar o povo e tirá-lo da miséria, Bolsonaro parece adormecer em berço esplêndido. Foi assim durante quase 30 anos de vida política, não seria diferente agora no cargo mais importante do país. O que mudou é que agora ele adormece junto de Guedes, Moro e companhia.

Após ter sido duramente criticado pela ridícula medida de apoio de 200 reais para trabalhadores autônomos e informais, a equipe econômica do governo se viu colocada contra a parede devido a diversas a reações pelo país a fora tendo que recuar e aceitar a proposta criada pela oposição (a rigor esse valor foi de uma proposta do Major Vitor Hugo do PSL), na qual aumentava em até 1200 reais tal remuneração (3). Entretanto, mesmo com as duras críticas recebidas, o governo não deixou de mostrar sua perversidade e vetou o trecho que ampliava o auxílio para 600 reais aos que tem acesso ao Benefício de Prestação Continuada (idosos e deficientes pobres – 4). O povo, agora, vê sua corda sendo cortada pelo mesmo Estado que salvou os banqueiros multibilionários.

E mesmo que os 600 ou 1200 reais sejam bem vindos e resolvam parcialmente o nosso problema da fome, ainda é pouco, não podemos cair na armadilha de comemorar esse valor como uma grande vitória, pois na prática ele significará que os trabalhadores e as trabalhadoras informais tenham que continuar se arriscando em ônibus lotado, nos bicos, a limpar casa de outras pessoas, vender coisas em trens e sinais, em poucas palavras: continuar se virando para colocar pão em casa! Quarentena tem que ser um direito e não uma obrigação e para garantir esse direito 1200 ou 600 reais não bastam, exigimos o salário minimo necessário calculado pelo DIEESE que leva em conta quanto uma família de 4 pessoas precisa para ter uma vida digna ao longo de um mês, que no mês de março/2020 estava em R$ 4.483,20, que se pago aos 40 milhões de desempregados por 3 meses daria apenas 45% do valor pago aos bancos de uma só vez.

Lucro indo para os bancos e prejuízo para os pobres.

Ainda em comparação com a ajuda as instituições financeiras, o “coronavoucher” aprovado de 600 ou 1200 reais representará para os cofres públicos cerca de 98 bilhões, isto é, apenas 1,3% do PIB enquanto aos bancos foi repassado 16,7%, como dissemos anteriormente. Além dessa absurda desproporção, o governo não para por aí. Chegaremos a quase um mês de crise pelo corona vírus e Bolsonaro e sua equipe ainda não possuem um projeto robusto e de peso que não apenas proteja os empregos atuais, mas crie novos postos de empregos para desempregados e crie também direitos para trabalhadores que estão na mão do setor informal, como as multinacionais de aplicativos (Uber, Ifood, Rappi e etc), empresas de cosméticos (revendedoras), domésticas, vendedores ambulantes etc.

O que o governo apresentou e usou de chantagem para aprovação do coronavoucher foi um projeto apelidado de PEC do Orçamento de Guerra. O que o governo não diz é contra quem é essa guerra. Enganam-se os que acham que é contra o coronavírus, essa guerra é contra os trabalhadores e as trabalhadoras, é contra os serviços públicos, é contra o povo, pois o projeto determina que o dinheiro que vai para os programas sociais possa ser usado para pagamento de dívida, que poderá crescer indefinidamente esse ano, e sabe para quem esse dinheiro acaba indo quando paga a dívida? Itaú, Bradesco e Santander, os mesmos bancos que já levaram R$ 1,2 trilhão dos cofres públicos. O projeto permite também que o Banco Central compre títulos podres desses bancos, o que significa em outras palavras, comprar as ações furadas e garantir que os prejuízos sejam arcados pelo nosso dinheiro público.

Lucro indo para os bancos e prejuízo para os pobres.

Esse projeto se seguiu a outros tão ruins quanto, que permitem suspensão e redução salarial, “negociação” direta entre patrão e trabalhador e estabelecimento de banco de dados com ampliação da jornada de trabalho em 2 horas quando do retorno das atividades.

Nada disso vai resolver nosso problema, pois os preços não param de subir e o governo não garante nossos direitos, pelo contrário, retiram cada vez mais e entregam no máximo uns poucos reais.

Para resolver nosso problema exigimos:

Recontratação imediata dos demitidos, com pagamento de salários garantidos pelo governo!

Abertura de novos postos de trabalho formais com garantias de direitos imediatamente após o controle da pandemia!

Suspensão e redução de mensalidades de universidades privadas!

Garantia de um auxílio emergencial que nos garanta a vida digna!

Assinam essa nota conjuntamente :

Resistência Popular Estudantil – Rio de Janeiro
Resistência Popular Estudantil – Marília
Resistência Popular Estudantil – Floripa

Fontes usadas no texto:

1 https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2020/03/24/internas_economia,836224/pacote-anunciado-pelo-governo-deve-liberar-r-1-2-trilhao-aos-bancos.shtml

2 – https://www.ocafezinho.com/2020/01/09/66-dos-brasileiros-estao-endividados-recorde-no-pais/

3 – https://www.infomoney.com.br/economia/auxilio-emergencial-de-r-600-especialistas-avaliam-efeitos-e-dificuldades-do-coronavoucher/

4 – https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/04/02/bolsonaro-beneficio-600-reais.htm

Que os ricos paguem pela pandemia!

Vemos se difundir pela televisão, internet e redes sociais a narrativa de que o Corona Vírus é o causador da crise na qual seguimos afundando. Tal narrativa, impulsionada pela grande mídia e governantes, busca esconder o cheiro de podre vindo do cadáver do atual modelo econômico. A necessidade permanente de crescimento e expansão (Lucrar, lucrar, lucrar…) do capitalismo e sua tendência à financerização são as verdadeiras causas do cenário de crise, e possível recessão, que é agravado e intensificado pela pandemia. Buscando expandir seus lucros para além da produção de mercadorias, sem correr os riscos diretos (compra de maquinário; matéria prima; custo com a força de trabalho), e se desenvolvendo proporcionalmente mais na esfera financeira, o grande capital especula em cima de um dinheiro que ainda não existe, e que pode vir a ser parte do lucro das empresas direcionado aos acionistas. Na medida em que mais e mais capitalistas preferem apostar no mercado financeiro, mais a produção industrial – produção de riqueza real, bem como geração de emprego – se enfraquece. Em 2019 a produção global enfraqueceu, pois o consumo enfraqueceu, logo o valor realizado, o rendimento dos dividendos, se distanciou do valor prometido. Assim bolhas explodem. Os grandes rentistas logo fogem para um investimento seguro, normalmente os títulos da dívida pública, principalmente norte-americana, ocorrendo assim a chamada “fuga de capitais”. Mas não nos deixemos enganar achando que esse processo alivie a pressão em torno de nossa dívida pública, pelo contrário, segue sugando mais da metade do nosso PIB, que vai parar no bolso de grande banqueiros.

Os recentes ataques aos direitos da classe trabalhadora contribuem para o cenário de caos social intensificado pela pandemia (que tende a se agravar nas próximas semanas). A reforma trabalhista, aprovada em 2017, acirrou a situação de vulnerabilidade socioeconômica das/os trabalhadoras/os, o que se torna evidente quando o direito a quarentena é negado aos trabalhadores informais, os quais, sem nenhuma garantia de renda, continuam a trabalhar. Enquanto isso, aos trabalhadores formais são impostas “férias antecipadas” ou demissões voluntárias. Ou seja, somos nós trabalhadores que estamos pagando pela pandemia. Além disso, o congelamento dos gastos públicos na área da saúde e educação promovidos pela EC 95 precarizou e sucateou nosso sistema de saúde público, que se mostra tão essencial em tempos de pandemia. Além dessas, a recém aprovada reforma da previdência obriga as/os trabalhadoras/es a pagar a conta das divídas de grandes sonegadores (bancos e grandes empresas que tem uma dívida bilionária à previdência e nunca a pagam devido às negociações e perdões fiscais) e condena o povo a trabalhar, quase que literalmente, até morte. Por mais que ainda estejamos sentindo as medidas dessa reforma em sua forma inicial, fica evidente que, em casos de crise como a que vivemos hoje, os trabalhadores mais velhos serão um dos grupos mais afetados, o que se agravará com o empobrecimento imposto pela reforma.

Bolsonaro, através de pronunciamentos esdrúxulos e genocidas, reflete o posicionamento da classe dominante: “o Brasil não pode parar por 5 ou 7 mil mortes” (Junior Durski, dono da rede de restaurantes Madero). Um estudo realizado pelo Dieese revela que um salário suficiente para pagar pelos produtos definidos pelo governo federal para uma cesta básica, seria de R$4.366,51, enquanto cerca de 60% de brasileiros vivem com cerca de R$928 reais por mês. 41,3% dos trabalhadores brasileiros são informais, segundo IBGE. Estes são camelôs, ubers, trabalhadoras domésticas sem carteira, etc, ou seja, pessoas sem FGTS, sem seguro desemprego, sem licença médica remunerada e sem fonte de renda que não venha da venda de sua mão de obra. O total desprezo pela vida dos trabalhadores é intensificado em períodos de crise e recessão econômica, mas é necessário frisar que a política de precarização e negação de uma vida digna já estava em curso com as medidas já mencionadas, as reformas e EMC 95. Devido a tal emenda o SUS já perdeu R$ 20 bilhoes desde 2016, e ainda terá um prejuízo de até 400 bilhões de reais até 2036. A medida anunciada no dia 18/03 por Guedes de 200 reais mensais para os trabalhadores informais durante o período da pandemia chega a ser um insulto. O valor irrisório junto as restrições ao acesso ao auxílio escancaram a frieza e indiferença dos gestores do capital quanto a vida do povo, nos jogando a uma situação de fome e miséria. A austeridade e o ajuste fiscal não veem barreiras, e o Estado policial recordista em matar no campo, do país recordista em matar transexuais, assim como o genocidio brasileiro dos povos da floresta, de negros e favelados e o feminicidio que ceifou 1314 vidas em 2019, ganha agora um incremento.

Somos nós os produtores, ou seja, sem nossa força de trabalho, não há transporte, de pessoas ou de alimento/mercadorias, não há venda; cobrança; pesquisa; não há indústria; internet; luz e energia. E como o que produzimos nos é furtado, são aqueles que nos furtam os preocupados com a queda da produção. Então porque somos nós quem devemos pagar com essa conta? O cenário é realmente impactante e devemos cobrar para que seja levado com seriedade, tanto pelos engravatados quanto por nossos companheiros de classe. Deve ser ressaltado sempre que nada existe sem nós trabalhadores, e que nada esperamos do Estado, porque a nós nada nunca foi dado e sempre conquistado. O momento é de ainda mais solidariedade e organização entre os nossos, não só para enfrentarmos o COVID19, mas também para cobrarmos cada gota de sangue de nossa classe derramada para o enriquecimento desses assassinos. E os ricos pagarão! Pagarão com suas cabeças e com as nossas riquezas que são usurpadas por eles, porque mais fortes são os poderes do povo!

Assinam:
Resistência Popular Estudantil – RJ
Resistência Popular Estudantil – Araraquara
Resistência Popular Estudantil – Marília
Resistência Popular Estudantil – Floripa
Resistência Popular Estudantil – RS
Resistência Popular Estudantil – Paraná