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RP COMENTA: “Pandemia reduz submissões de artigos acadêmicos assinados por mulheres” (Revista Dados) 

 

Leia a notícia: http://dados.iesp.uerj.br/pandemia-reduz-submissoes-de-mulheres/

Segundo a revista acadêmica de ciências sociais Dados, o número de mulheres que submeteu artigos para a revista no segundo trimestre de 2020 é o menor desde 2016. Quando se considera textos com a primeira autora mulher, a revista afirma que embora a média desses manuscritos entre 2016 e o primeiro trimestre de 2020 tenha sido de 37%, esse patamar caiu para 13% neste trimestre.

A própria revista alerta que “esses dados são preliminares e demandam cautela analítica”, por se tratar de período inconcluso e envolver apenas uma revista. No entanto, é importante salientar como ela parece ser mais um dado num padrão de aprofundamento das desigualdades de gênero a partir da crise social provocada pela pandemia de Covid-19. Como apontamos em nossa série de textos, a crítica quanto à EaD se deve em parte à preocupação semelhante acerca dos efeitos distintos que sua implementação tem quanto a vários recortes sociais, o de gênero não sendo menos importante.

Como nossas companheiras da Resistência Popular Estudantil – RJ apontaram recentemente, “vivemos numa sociedade na qual o patriarcado é sustentado estruturalmente, fomentando a opressão de gênero e o machismo, ou seja, ser mulher é um grande desafio”. Nossa luta dentro nas estruturas acadêmicas e científicas passa por denunciar justamente as estruturas que, de maneira insidiosa e sutil, acumulam-se em distorções e injustiças ao longo do tempo.

RP COMENTA: “Laureate usa robôs no lugar de professores sem que alunos saibam” (Agência Pública)

Leia a notícia: https://apublica.org/2020/04/laureate-usa-robos-no-lugar-de-professores-sem-que-alunos-saibam/

Segundo denúncias obtidas pela Agência Pública, a rede de instituições de educação a distância (EaD) Laureate está usando um programa de computador (LTI) para corrigir atividades dissertativas de suas estudantes. Dirigentes proibiam que estudantes fossem informadas de que isso estava acontecendo – e não é difícil entender por quê: cheias de problemas, as correções automáticas não são capazes de refletir o real desempenho estudantil, e inclusive deixam passar plágios.

Esta notícia é um exemplo perfeito do que discutimos em nossas recentes análises sobre a EaD na pandemia: tecnologias como esta subvertem completamente o real significado da educação, privando as estudantes de um desenvolvimento mais adequado da relação com professoras no momento avaliativo. Além disso, prejudica também a perspectiva da classe trabalhadora docente, pois com o tempo o sistema será certamente “aperfeiçoado” para que engane as estudantes o suficiente para não gerar reclamações (não importando o que tenham aprendido, ou que tipo de profissionais e seres humanos serão). Absolutamente NINGUÉM ganha com isso, exceto os acionistas da empresa, que amplia seu poder no âmbito dos conglomerados educacionais privados. O fato de a medida ter sido escondida e aplicada em tempos de pandemia torna este projeto ainda mais cruel.

Como apontamos em nossa série de textos, é preciso ser crítico quanto à maneira como as tecnologias são apresentadas como soluções miraculosas, especialmente em tempos de crise. Através da naturalização da EaD e de nosso engajamento acrítico com ela, aprendemos que “educação” significa receber um depósito de conteúdo pronto isoladamente em nossas casas, gerenciando nossos próprios problemas de aprendizado usando ferramentas monopolizadas por empresas, sem buscar alternativas para a promoção de igualdade e solidariedade nesse processo. Isso não é educação a distância, mas tão somente distância: ficamos cada vez mais longes do mundo que deveríamos estar construindo no rastro de destruição que a pandemia deixa no tecido social.

RP COMENTA: “Empresas de ônibus da Grande Florianópolis suspendem contratos por dois meses” (ND+)

Leia a notícia: https://ndmais.com.br/noticias/empresas-de-onibus-da-grande-florianopolis-suspendem-contratos-por-dois-meses/

Com as medidas de isolamento social tomadas pelo governo do estado de Santa Catarina e a prefeitura de Florianópolis, o transporte público na Grande Florianópolis está suspenso desde 18 de março. Os ônibus na região são do Consórcio Fênix (Canasvieiras, Emflotur, Estrela, Transol e Insular) e também das empresas Jotur, Biguaçu e Imperatriz, nomes conhecidos daquelas que lutam contra o monopólio do sistema público de transporte – em 2014, a Consórcio Fênix ganhou licitação para atuar por 20 anos no transporte da cidade. A suspensão do contrato afetará milhares de trabalhadoras em um momento de pandemia e crise social. 

A suspensão tem como base a MP 936, medida com força de lei instituída pelo presidente Bolsonaro, que prevê suspensão dos contratos por parte dos patrões por até 60 dias ou dimunuição da carga horária de trabalho, com consequente perda salarial para a trabalhadora. O Estado se responsabiliza por pagar os salários daquelas que tinham o direito de continuar empregadas, para livrar os ricos de pagarem pela pandemia. É o patrão enchendo o bolso, enquanto os pobres mendigam por uma renda mínima pra passar por essa pandemia. Lembrando ainda que a MP tem como base não o salário pago pelo patrão à trabalhadora, o Estado calcula sobre o valor que pagaria em seguro-desemprego, o que pode acarretar uma diminuição da renda das trabalhadoras. Segundo cálculo por DIEESE, um salário de R$1500, cerca de um salário mínimo e meio, cai para $1290 com a suspensão do contrato – levando em conta que as empresas de ônibus se encaixam na categoria de empresas com receita anual maior que 4,8 milhões de reais. 

Muitos patrões têm se utilizado dos benefícios que a MP traz para os de cima. Luciano Hang, dono da rede de lojas HAVAN, suspendeu o contrato de 11 mil funcionárias. Já a Catarinense, companhia de ônibus intermunicipal e estadual, fez a suspensão de forma unilateral, sem diálogo com a categoria ou com o sindicato. Os custos do repasse de pagamento salarial, que sai da responsabilidade do patrão por dois meses e passa para o poder público, serão de dezenas de bilhões de reais por todo o país.

No caso das companhias de transporte da Grande Florianópolis, assim como é o caso da Havan, trata-se de empresas com lucros anuais altos. Como estudantes, vivemos anualmente o drama do aumento da tarifa, como se fosse já um ritual de ano novo e sempre sob a justificativa de prejuízo por parte das empresas, como se os donos fossem bons samaritanos oferencendo transporte público à cidade. A tarifa aumenta e o lucro dessas empresas se mantém constante. Há vários episódios de nossa história de luta em Florianópolis mostrando a digna raiva do povo contra essa equação, como as Revoltas da Catraca (2004 e 2005) e as Jornadas de Junho (2013). 

A suspensão dos contratos das trabalhadoras do transporte público da Grande Florianópolis reflete o caráter dessa MP, que diminui a renda de muitas trabalhadoras enquanto alivia o bolso do patrão. O que é necessário é uma renda mínima universal de um salário mínimo a milhões de brasileiras em trabalhos informais ou em situação de desemprego. Para aquelas contratadas, faz-se necessário que os patrões arquem com a crise e abram mão de seu lucro astronômico. Durante a pandemia que vivemos, que demanda alto investimento do Estado para garantir a vida das classes mais vulneráveis, é necessário que os mais ricos sejam taxados, sem condições de ampliar seu lucro ou minimizar perdas que não fazem cócegas em contas milionárias. É necessário lutar por vida digna para as nossas e combater o lucro dos patrões! 

Como estudantes e usuárias do transporte público, saudamos motoristas e cobradoras, categoria que deve permanecer em isolamento social. Com o alto fluxo de passageiras, o retorno do transporte público não pode ser uma possibilidade durante o combate à pandemia, pelo impacto que isso pode causar em toda a população e a super exposição dessas trabalhadoras. 

QUE OS RICOS PAGUEM PELA PANDEMIA!

Por um DCE construído de baixo para cima: propostas para o Regimento do CEB

O Conselho de Entidades de Base (CEB) é uma ferramenta importante na construção da mobilização estudantil. A existência de um Regimento para o CEB pode cumprir um papel importante por apresentar a natureza deste Conselho e explicitar os meios justos para seu funcionamento, como convocatórias, quórum e formas de deliberação. No entanto, o processo de elaboração do Regimento deve representar um acordo construído no movimento estudantil. Ao contrário disso, a Diretoria do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFSC afirma um acordo consigo mesma sobre uma proposta elaborada por apenas um Centro Acadêmico (CA), buscando aprová-la o mais rápido possível, sem considerar o desgaste consequente para as lutas do movimento estudantil

Até o momento, já foram convocadas 09 reuniões de CEB tendo como pauta única a discussão da proposta regimentarsendo que 03 delas não atingiram quórum mínimo de apenas 16 CAs e inúmeras foram incapazes de votar um ponto sequer, restando ainda 13 artigos com destaques pela frenteTrata-se de um documento composto por 20 artigos, mas incompleto para regimentar um espaço em constante disputa, o que ainda nos leva a ter pela frente a discussão de sugestões e críticas a pontos ausentes. Nesse processo, Centro Acadêmico Livre da ArquiteturaCentro Acadêmico da BiologiaCentro Acadêmico Livre da Psicologia – três dos CAs mais atuantes no movimento estudantil da UFSC – já lançaram notas críticas à proposta e à forma como a Diretoria do DCE vem tocando a discussão.

A Coletiva Centospé tem acompanhado os debates sobre o Regimento e entende que o processo longo e improdutivo, desde a reformulação do texto às votações, é consequência da falta de discussões aprofundadas sobre a natureza do Conselho e seus objetivos. Há uma tentativa da Diretoria do DCE em “mostrar serviço” através da produção de um Regimento que sirva como legado da gestão, o que compromete todo o movimento estudantil com uma pauta arrastada e cheia de atropelos.

Para resistir em defesa de uma Universidade Pública e Popular, a militância estudantil precisa dar centralidade às mobilizações. Nas últimas semanas, vivemos momentos importantes na luta por moradia estudantil, no caso da postura racista da diretora do CFH (Centro de Filosofia e Ciências Humanas) com as estudantes indígenas, no corte nacional às bolsas permanência indígena e quilombola,  na luta contra as fraudes nas Ações Afirmativas raciais. São apenas alguns exemplos de pautas que não podem ficar restritas às reuniões amplas da Diretoria do DCE, que não possuem tradição de agregar as diferentes forças políticas da UFSC. Enquanto isso, um espaço de luta legitimado como o CEB é condenado a uma agenda burocrática em torno de si mesmo.

Nós acreditamos que um movimento estudantil forte não se constroi a partir da direção das entidades representativas, por isso não compusemos nenhuma chapa nas eleições à Diretoria do DCE. Buscando dialogar com as bases do movimento estudantil e contribuir com o debate dos Centros Acadêmicos e forças políticas da Universidade, faremos algumas considerações sobre princípios que implicam outra forma de enxergar o Regimento do CEB.

Autonomia das entidades de base

Cada entidade de base é resultado dos acordos e acúmulos feitos no movimento estudantil de seu Curso, na diversidade de suas lutas e debates, o que garante, por exemplo, a legitimidade de CAs autogestionados sem processo eleitoral é a sua própria base; por isso, não cabe à Diretoria do DCE o controle sobre as formas organizativas de cada CA. Além disso, o Conselho é orgão fiscalizador do DCE, não das entidades de base, então não é pertinente que ele legisle sobre como cada CA deve enviar representantes ou garantir que sua representação seja legítima.

Segundo o Estatuto do DCE, o CEB é um órgão administrativo do DCE (assim como a Diretoria, a Assembleia Estudantil e o Congresso Estudantil) e possui caráter deliberativo, consultivo e fiscalizador. A Diretoria é apenas o órgão executivo do DCE e o CEB está acima dela, ao mesmo tempo em que o Conselho está submetido apenas às Assembleias e Congressos. Dessa forma, também não cabe à Diretoria do DCE o controle sobre o CEB, nem a garantia de mesa das sessões, uma vez que o CEB parte das entidades de base.

Aliás, cabe ressaltar que, ao contrário do que se costuma dizer, o DCE não é a Diretoria; toda estudante faz parte do Diretório.

CEB como instrumento de luta

O CEB serve para organizar as lutas do movimento estudantil, então o seu engessamento não pode estar previsto no Regimento. É necessário garantir a liberdade para discutir qualquer assunto que for sugerido como pauta, cumprindo o acordo de quórum para a sessão, sem ferir a autonomia dos CAs em deliberar sobre os temas que se julgar pertinentes em determinada conjuntura.

Um Regimento que não compreenda essa dimensão e não dialogue em sua concepção com a natureza de mobilização do Conselho, cai em uma burocratização que pode impedir a ação efetiva nas situações reais. É necessário garantir ao CEB a agilidade necessária para mobilizar lutas e lidar com qualquer emergência que aparecer pela frente, permitindo a convocação pelas entidades de base e a inclusão de pautas emergenciais fora do prazo, desde que seja resguardado algum mecanismo de veto a uma pauta sem a antecedência necessária.

Todo poder ao CEB

Uma reunião de CEB, organizada com pauta em antecedência, convocação aberta e quórum de CAs para tomar decisões, é muito mais legítima e democrática que uma reunião interna de Diretoria, onde podem estar poucas estudantes e sem uma representação significativa dos cursos – o mesmo vale para as reuniões abertas, como tem realizado a atual gestão. Por isso, defendemos que o CEB tem legitimidade para tomar qualquer decisão dentro dos limites do Estatuto e das posições de Assembleias e Congressos, o que envolve todas as ações da Diretoria.

Isso significa, por exemplo, que o CEB tem legitimidade para tirar notas de posição e organizar atividades em nome do DCE, deliberar sobre o uso do dinheiro, decidir sobre as posições a ser levadas nas instâncias universitárias e tomar ações a respeito dos seus espaços físicos.

Através da autonomia e do poder devidamente localizados nas entidades de base, temos um incentivo para sua construção e fortalecimento pelas forças do movimento estudantil, reforçando a importância da presença dos Centros Acadêmicos. Essa mudança de percepção da relação CEB-DCE valoriza o esforço de quem está efetivamente construindo as lutas no cotidiano e vivenciando as bases.

Quanto mais poder o Conselho possuir, menor é a pressão para que se jogue toda a força do movimento estudantil nas eleições da Diretoria do DCE, o que inclui os gigantescos gastos financeiros e de tempo envolvidos. Diminui também, automaticamente, a pressão para construir chapas com centenas de membros, onde na prática a grande maioria não vai construir a gestão, além de perder força a tática desleal de organizações políticas de trazerem militantes de fora da UFSC para ajudar nas campanhas – que não agrega em nada para a luta.

Horizonte organizativo do Movimento Estudantil

Defendemos esses princípios para subsidiar a construção coletiva de uma nova proposta de Regimento para o CEB, mas sabemos que eles também apontam em direção a uma transformação fundamental para o DCE e para o movimento estudantil da UFSC: o abandono do modelo de Diretoria eleita e adoção da gestão cotidiana da entidade através das entidades de base, em reuniões do ConselhoLembramos que o DCE UFSC já funcionou durante um semestre inteiro sem Diretoria em 2011, organizado a partir de reuniões do CEB, uma experiência em que a entidade manteve seu bom funcionamento.

Esse horizonte é importante para nós porque traz consigo uma pedagogia da ação direta, em que não delegamos nossa capacidade de intervenção política para uma Diretoria que fala em nosso nome, mas fortalecemos a lógica de que é preciso fazermos nós mesmos o que queremos que seja feito. Para nós, é isso que significa o lema de fazer por nossas mãos tudo que nos diz respeito“.

Existe um papel importante cumprido pelas eleições anuais do DCE, que é o debate sobre o projeto de movimento estudantil e o projeto de Universidade que nós queremos. Porém, quando estamos elegendo pessoas e não diretamente os projetos, existe um forte rebaixamento da política para a lógica eleitoral, onde se criam falsas alianças para entrar melhor na disputa pelo cargo e se defendem determinadas propostas com fim exclusivo de atrair votos, sem real interesse em construir essas ações. Sugerimos transformar a eleição da Diretoria em um Congresso de Estudantes da UFSC, quando se debatem e aprovam teses.

Com uma eleição de teses  propostas políticas práticas, e não um conjunto de pessoas (chapa)  o debate passa a girar em torno das pautas, sem necessária formação de blocos ou alianças. Assim, perdem espaço os votos personalistas, as manobras eleitorais e o posicionamento interesseiro das chapas para convencerem estudantes alheias ao debate a votar em cima da hora. Por sua vez, o que ganhamos com essa forma organizativa é a possibilidade de focar os debates sobre os projetos de Universidade e as lutas que precisamos para construí-los, contando com a força e a presença de quem está disposto a trabalhar, não de quem apenas busca o controle das entidades representativas.

O que defendemos aqui é um horizonte de auto-organização e construção desde a base no DCE. O movimento estudantil é a ação conjunta das estudantes para transformar a realidade. Com as práticas de autonomia, participação direta e combatividade é que se constroi uma educação a serviço do povo e uma nova sociedade.

Coletiva Centospé

Florianópolis, 21 de junho de 2018

Centospé comenta: “Como o Perini se prepara para receber a UFSC em março” (Jornal ANotícia)

Leia a reportagem: “Como o Perini se prepara para receber a UFSC em março” (Jornal ANotícia)

O jornal A Notícia de Joinville publicou no final do ano passado uma longa matéria sobre o campus da UFSC na cidade. Nela, ficamos sabendo que a Universidade vai pagar 412 mil reais por mês para um condomínio privado de empresas receber as aulas da UFSC nos próximos cinco anos, totalizando 24,720 milhões de reais no período, que ainda podem ser renovados por mais 5 anos.

Ao invés da Universidade construir seu próprio campus, está dando todo esse dinheiro para o Perini Business Park construir três blocos que recebam os milhares de estudantes de Joinville. O montante gasto se soma ao histórico de obras inconclusas no campus próprio e os aluguéis de prédios desde 2009, totalizando mais de 70 milhões de reais gastos sem a construção de sequer uma sala de aula própria. Nesta segunda (05/03), a UFSC realiza ato solene de instalação do campus, com presença do reitor pró-tempore, Ubaldo Balthazar.

Mas o gasto financeiro não é o que há de mais sério em risco, mesmo com a redução anunciada de 27 milhões de reais no Orçamento da UFSC para 2018. Enquanto constrói toda a estrutura para abrigar a UFSC Joinville, o Perini Business Park e os executivos de suas 150 empresas já conversam e planejam o que esperam da Universidade.

Para o empresariado, não há dúvida de que essa é uma ótima oportunidade de conseguir mão de obra barata, de economizar custos na formação profissional e principalmente na pesquisa e desenvolvimento, cooptando o recurso público e toda a estrutura e capacidade humana da Universidade para resolver seus problemas privados – obviamente, com usufruto privado de todo o lucro decorrente. Os princípios da Universidade pública, o olhar para as necessidades populares, a formação humanista e generalista, a autonomia na produção científica, tecnológica e artística ficam todos extremamente ameaçados por essa relação.

A alocação de um campus inteiro de uma Universidade Federal dentro de um business park privado é um perigoso precedente, um ousado passo na capacidade do mercado em direcionar a educação pública, que se soma a iniciativas nefastas como cobranças em especializações, parcerias público-privadas, o empresariamento da formação através das Empresas Júnior, a ação das fundações, as empresas públicas de direito privado (como a EBSERH) e as tentativas mais explícitas de privatização.

Assim como existe formação para os interesses do mercado, existe uma formação para as necessidades das classes oprimidas. Essa disputa atravessa tudo que acontece na Universidade, incluindo nossos currículos formais, os temas discutidos em sala de aula, as saídas de campo, os estágios, a extensão universitária, a pesquisa nos núcleos e laboratórios. Em Joinville, um dos lados da disputa vai começar a jogar em casa, mas pouca gente tem levantado a voz contra a vantagem desleal. Defendemos a Autonomia Universitária como um princípio que engloba a autonomia financeira, autonomia de gestão e autonomia pedagógica, que só podem existir com independência das forças do mercado, pela garantia do orçamento público na mão da UFSC, de estrutura própria e de currículos e propostas pedagógicas planejadas pela comunidade universitária, pelas comunidades do entorno e pelos movimentos sociais.

Universidade pública é para servir os interesses do povo!
Fora iniciativa privada da UFSC!

Coletiva Centospé
Março de 2018

Centospé comenta: “Gênero e raça de estudantes do ensino superior no Brasil por curso e área” (Nexo Jornal)

Leia a reportagem: “Gênero e raça de estudantes do superior no Brasil por curso e área” (Nexo Jornal)

Dados do Censo da Educação Superior (INEP, 2016) mostram que a UFSC é a Universidade Federal mais branca do País. Não é apenas consequência de sermos o Estado com a população mais branca, até porque a UFSC sempre recebeu muitas estudantes de outros cantos, especialmente após 30% de ingresso na Universidade ser via SiSU. É um resultado construído propositalmente pela Universidade.

É consequência da falta de políticas de permanência, como a quantidade baixíssima de vagas na Moradia Estudantil, a falta de bolsas de permanência, as longas filas que obrigam a escolher entre ir pra aula ou comer, a lotação do LabUFSC e a insuficiência dessa estrutura para quem não tem computador realizar vários tipos de tarefas acadêmicas, etc.

É consequência também do racismo de muitos servidores docentes, que realizam assédio, perseguição ou chacota de estudantes negros ou indígenas nas salas de aula, como ocorreu em um caso bastante discutido no Design ano passado. Consequência da falta de acolhimento na PRAE, onde faltam respostas para as necessidades de tantas de nós e sobram denúncias de tratamento vexatório. Consequência também do racismo de outras e outros estudantes, enquanto crescem os símbolos da organização de extrema-direita na UFSC (como os ataques à sala Quilombo esse ano) que não são investigadas ou levadas a sério.

Defendemos a prioridade de investimentos para as políticas de assistência estudantil e permanência, o avanço das ações afirmativas na graduação, sua adoção na pós graduação e nos concursos para trabalhadoras da UFSC. Também a investigação e o combate aos casos de racismo e assédio por parte de servidores e estudantes da instituição. O respeito da Universidade às trabalhadoras e trabalhadores terceirizados, de maioria negra, que além dos enormes ataques a seus direitos trabalhistas, ainda tiveram sua alimentação fortemente dificultada em 2017 pelo aumento no passe do RU (de R$2,90 para R$6,10). Por fim, o reconhecimento da Universidade ao movimento negro e movimento indígena para pensar junto todas as políticas que digam respeito a suas lutas.

Pintar a Universidade da cor do povo!