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As eleições para a Reitoria e a disputa pela autonomia universitária

A consulta à comunidade universitária para a eleição de um novo reitor na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) não é uma consequência imediata ou automática da vacância do cargo após os eventos de 2017: ela só está ocorrendo por conta da pressão exercida através da Comissão Unificada de Mobilização, que fez vigílias contra a perspectiva de que o Conselho Universitário poderia nomear um novo reitor de forma autocrática. Agora, consideramos fundamental interpretar alguns elementos do momento político, discutir o significado da autonomia universitária, caracterizar as chapas em disputa pela Reitoria e expressar nossa postura frente à eleição e à futura Reitoria.

A autonomia universitária

A questão da autonomia é tema central na UFSC neste momento, especialmente em decorrência do abuso de poder do Estado que a intervenção da Polícia Federal e do Judiciário na gestão universitária representam. Poucos meses depois destes acontecimentos em nossa universidade, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) também foi alvo de uma operação coercitiva da Polícia Federal que tomou ares de condenação na grande mídia, mesmo quando as investigações ainda estavam no início, ocorrendo em sigilo. A atual situação da Universidade Federal do ABC (UFABC) é outro elemento para o debate sobre autonomia, uma vez que esta universidade passou pelo processo de escolha de seus dirigentes há meses, mas não houve nomeação pelo Ministério da Educação do reitor eleito, o que motivou um indicativo de greve docente.

Esse não é um tema novo, pois nos remete à memória de resistência às intervenções autoritárias do Estado e das polícias nas universidades durante a ditadura civil-militar, período de grande protagonismo estudantil. Hoje, no entanto, o termo parece ter se tornado um grande jargão usado para defender interesses diversos. Embora a Constituição assegure às universidades autonomia didático-científica, administrativa, e de gestão financeira e patrimonial, diferentes maneiras de interpretar e efetivar essa autonomia da Universidade frente ao Estado e ao mercado possibilitam que cada campo político utilize o termo para defender projetos bastante diferentes de Universidade. 

A gestão Cancellier, por exemplo, usou de sua autonomia para realizar parcerias entre a Universidade e o governo de Israel, abrindo espaço para que o país oferecesse aulas e cursos aqui, bem como para defender parcerias privadas com empresas israelenses. De nada serve autonomia para aliar-se a Estados genocidas sem qualquer princípio de democracia interna, já que a proposta não foi debatida pela comunidade, ainda mais quando isso ainda representa uma submissão a interesses de mercado. Poderíamos fazer comentários similares a respeito de como as gestões Cancellier e Ubaldo decidiram permitir o uso de áreas da UFSC para treinamento militar ou como consideraram que a alocação de laboratórios e campi dentro de condomínios empresariais representavam um novo modelo institucional. A “autonomia universitária” por si só, portanto, não é garantia de uma universidade mais democrática ou popular.

Na UFSC, os órgãos deliberativos Conselho de Curadores e Conselho Universitário (CUn) são espaços-chave para exercer a autonomia financeira e administrativa. No entanto, predominam neles os professores, que compõem numericamente a menor categoria em comparação com o corpo discente e de servidores técnico-administrativos da instituição, enquanto a comunidade externa não tem praticamente espaço algum. Além de lutar por mais democracia interna, precisamos avançar o debate para o controle social da universidade, isto é, a capacidade da comunidade externa, do povo que vive nos bairros do entorno, da classe trabalhadora da região e dos movimentos sociais de nosso Estado influenciarem os rumos da instituição. A participação da comunidade nestas e em outras instâncias universitárias pode ser um caminho para o controle social, como por exemplo na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), que surgiu a partir de demandas populares e atualmente conta com a participação da comunidade externa em seus processos decisórios, incluindo as eleições para a Reitoria. 

Discutir a autonomia da universidade é particularmente relevante neste período de desmonte das universidades públicas, em meio a um avanço autoritário do Estado e às iniciativas privatistas. Isso envolve exigir os recursos necessários para nosso funcionamento, sem rabo preso na cobrança ao governo, mas também a autonomia na proposta político-pedagógica, de forma a direcionar nossa formação, nossa extensão e nossas pesquisas para rumos que não sejam determinados pelas necessidades do mercado, nem mesmo por certos projetos de Estado, quando sabemos que essa é uma estrutura de poder das classes dominantes. Mesmo as ações em que temos alguns avanços, como o aumento das vagas no ensino superior público ou as ações afirmativas para ingresso, são conquistas arrancadas do Estado pela luta popular.

A partir dessa interpretação da autonomia universitária, passamos a analisar as candidaturas nas eleições à reitoria de 2018.

Os candidatos e seus campos políticos

Os candidatos à consulta pública para a Reitoria da UFSC no segundo turno são o atual reitor pro tempore, Ubaldo Cesar Balthazar, e o diretor do Centro Sócio-Econômico (CSE), Irineu Manoel de Souza. Ambos posicionam-se a favor de uma universidade autônoma, mas cada um entende o termo à sua própria maneira: 

A candidatura de Ubaldo dá continuidade à última gestão (o mote “A UFSC pode mais” é o mesmo utilizado na campanha de 2015 de Cancellier) e se propõe a devolver a universidade ao “equilíbrio”, uma alternativa de ajuste e acomodação ao cenário político de fortes retrocessos que vivemos. Enquanto reitor, Ubaldo se posiciona no máximo de forma tímida frente aos ataques do Governo Federal, quando pressionado. Em sua gestão, saudou a iniciativa privada dentro da universidade ao colaborar com a instalação do campus Joinville em um condomínio industrial privado, declarando sua satisfação com a criação de “um celeiro de oportunidades, com indústria e centenas de jovens estudantes prontos a responder às questões apontadas pelo mercado. Mesmo durante a campanha eleitoral, recusou a participação no debate organizado pela entidades estudantis e não respondeu à Carta de Reivindicações da Associação de Pós-Graduandos (APG). Nas últimas semanas, sua gestão descumpriu todas as promessas feitas relativas à situação da Moradia Estudantil na UFSC, onde sua gestão manteve o legado recebido de inexplicáveis vagas ociosas, infestação de ratos, vazamentos e goteiras. Acreditamos que isso demonstra uma forte tendência a uma gestão incapaz de ouvir estudantes, em particular as demandas por permanência, mas que está predisposta a agradar o Governo Federal e estimular o caminho de submissão de nossa instituição aos interesses de uma minoria.

Quanto à candidatura de Irineu, identificamos pontos positivos em seu programa de chapa como a centralidade nas pautas por permanência estudantil, defendendo avanços em temas fundamentais como Restaurante Universitário, Moradia Estudantil, Ações Afirmativas e as festas. Posiciona-se contra a presença da Polícia Militar nos campi, defendendo o reestabelecimento do cargo de segurança institucional para as Universidades Federais, e tem demonstrado capacidade de se posicionar de forma crítica às políticas do Governo Federal, às parcerias público-privadas e às Fundações de Apoio, outra porta de entrada do interesse privado nas universidades. Desde o início do debate sobre a EBSERH, foi uma voz contrária à adesão do Hospital Universitário à empresa pública de direito privado – após mais de um ano de funcionamento pela EBSERH, o HU apresenta graves problemas de falta de contratações e está esporadicamente com sua emergência fechada. Cabe ressaltar, por fim, sua postura aberta de apoio à redução da jornada de trabalho de servidores técnico-administrativos e ao aumento de sua representação nas instâncias da Universidade.

Nossa posição frente à disputa

A Coletiva Centospé acredita em um projeto de Universidade radicalmente diferente do atual, que seja voltado diretamente às necessidades populares e à transformação da sociedade. Acreditamos que é papel do movimento estudantil construir uma força social e política autônoma, capaz de avançar neste objetivo estratégico sem abrir mão de princípios, sem ceder nossas forças, nem submeter os interesses estudantis e populares à conciliação com nossos inimigos de classe.

Nesta quarta, votaremos no candidato Irineu (80) e convidamos a comunidade universitária a votar junto a nós, pelas diferenças expostas em seus projetos de Universidade e pela perspectiva de um outro patamar de disputa de nossas demandas frente à futura Reitoria. Independente de quem levar a eleição, seguiremos como oposição de esquerda dentro do movimento estudantil e dos espaços de construção coletiva das categorias na UFSC, pois qualquer vitória concreta só pode ser consequência de organização e luta independente, capaz de alterar a correlação de forças e arrancar conquistas.

Mais fortes são os poderes do povo!

Coletiva Centospé,

09 de abril de 2018

Centospé comenta: “Gênero e raça de estudantes do ensino superior no Brasil por curso e área” (Nexo Jornal)

Leia a reportagem: “Gênero e raça de estudantes do superior no Brasil por curso e área” (Nexo Jornal)

Dados do Censo da Educação Superior (INEP, 2016) mostram que a UFSC é a Universidade Federal mais branca do País. Não é apenas consequência de sermos o Estado com a população mais branca, até porque a UFSC sempre recebeu muitas estudantes de outros cantos, especialmente após 30% de ingresso na Universidade ser via SiSU. É um resultado construído propositalmente pela Universidade.

É consequência da falta de políticas de permanência, como a quantidade baixíssima de vagas na Moradia Estudantil, a falta de bolsas de permanência, as longas filas que obrigam a escolher entre ir pra aula ou comer, a lotação do LabUFSC e a insuficiência dessa estrutura para quem não tem computador realizar vários tipos de tarefas acadêmicas, etc.

É consequência também do racismo de muitos servidores docentes, que realizam assédio, perseguição ou chacota de estudantes negros ou indígenas nas salas de aula, como ocorreu em um caso bastante discutido no Design ano passado. Consequência da falta de acolhimento na PRAE, onde faltam respostas para as necessidades de tantas de nós e sobram denúncias de tratamento vexatório. Consequência também do racismo de outras e outros estudantes, enquanto crescem os símbolos da organização de extrema-direita na UFSC (como os ataques à sala Quilombo esse ano) que não são investigadas ou levadas a sério.

Defendemos a prioridade de investimentos para as políticas de assistência estudantil e permanência, o avanço das ações afirmativas na graduação, sua adoção na pós graduação e nos concursos para trabalhadoras da UFSC. Também a investigação e o combate aos casos de racismo e assédio por parte de servidores e estudantes da instituição. O respeito da Universidade às trabalhadoras e trabalhadores terceirizados, de maioria negra, que além dos enormes ataques a seus direitos trabalhistas, ainda tiveram sua alimentação fortemente dificultada em 2017 pelo aumento no passe do RU (de R$2,90 para R$6,10). Por fim, o reconhecimento da Universidade ao movimento negro e movimento indígena para pensar junto todas as políticas que digam respeito a suas lutas.

Pintar a Universidade da cor do povo!

23/11 | CHICO #NãoVaiTerRedução

É dos morros do Rio de Janeiro e da resistência das favelas cariocas onde brota e floresce arte. A Coletiva Centospé convida todas e todos para a ESTREIA EM FLORIANÓPOLIS de Chico, um filme dos Irmãos Carvalho. Através de uma produção de cinema da periferia, apresentamos um manifesto contra a redução da maioridade penal e o encarceramento em massa do povo negro.

A exibição será feita no Auditório Professor João Ernesto Escosteguy Castro, no prédio de Engenharia de Produção (CTC) da UFSC, dia 23/11 às 18:30h. Após o filme, teremos uma RODA DE CONVERSA sobre a redução da maioridade penal e o racismo do sistema judiciário. Logo mais divulgamos os nomes de quem vai fortalecer nesse espaço!

#NãoVaiTerRedução
#VaiTerCinema



Direção de Irmãos Carvalho (2016) – 23min

2029. Treze anos depois de um golpe de Estado, o cerco se fechou contra as populações periféricas. Dentre os retrocessos levados a cabo pelo novo governo, está a aplicação de tornozeleiras eletrônicas em crianças pobres, negras e faveladas em seu nascimento para rastreá-las. O governo pressupõe que elas irão, cedo ou tarde, entrar para o crime.

Chico é mais uma dessas crianças. No seu aniversário de 10 anos, é aprovada a Lei de Ressocialização Preventiva, que autoriza a prisão desses menores. O clima de festa dará espaço a uma separação dolorosa entre Chico, sua mãe e sua avó.

Você pode assistir o trailer em: https://www.facebook.com/FilmeChico/videos/485434798324787/

Para mais informações sobre a produção, é só curtir a página Chico!

Quem é Michel Temer na fila do pão?

Artigo escrito a partir das oficinas de análise de conjuntura realizadas nas primeiras semanas de dezembro de 2016 pela mobilização estudantil da Biologia – UFSC, que ocupou o Centro de Ciências Biológicas da UFSC e deu origem à Frente de Arte e Resistência CENTOSPÉ.


“Bater no governo
É coisa do passado
Agora a moda é
No empresariado!”

Primeiramente… primeiramente o quê?

O grito “Fora Temer” ecoou por todas as manifestações populares desde o impeachment. Mais do que isso, essa chamada tomou os muros das cidades, fez parte das músicas e manifestos das escolas ocupadas, roubou segundos de televisão nas invasões das entrevistas ao vivo. “Fora Temer” também esteve presente nas diversas manifestações das artes capazes de refletir seu próprio tempo – para usar as palavras de Nina Simone sobre a essência do fazer artístico.

Agora que temos novas palavras de ordem competindo como elemento unificador das lutas – “Fora PEC 55”, “Contra a MP 746”, “Contra a Reforma da Previdência”, etc. – cabe perguntar: a que propósito serve o chamado por “Fora Temer”? Além de Temer, quem são os agentes por trás desse pacote de maldades em forma de programa de governo? O que quer Sérgio Moro e a Lava Jato? Qual o controle de Temer e do PMDB sobre os outros grandes partidos na Câmara e no Senado? Qual o papel dos grupos que puxaram os atos pelo impeachment nessa nova conjuntura? Por fim, quais rumos podemos tomar como resistência de esquerda nas ruas, escolas, universidades e locais de trabalho?

Uma das perdas que vêm com o pacote de retrocessos apresentado pelo governo de Michel Temer é a Medida Provisória 746, a qual altera o Ensino Médio. No entanto, muito antes de Temer começar a sonhar com o cargo presidencial – antes mesmo de ser mero vice decorativo de Dilma – já havia todo um setor do empresariado nacional articulado, ansiando pelo momento de colocar seus interesses bilionários na mesa. O movimento chamado “Todos Pela Educação” foi um dos grupos ouvidos pelos parlamentares acerca da reformulação do Ensino Médio, entre outros agentes poderosos esmiuçados na reportagem do The Intercept. O “Todos Pela Educação” existe desde 2005 e reúne grupos como Itaú, Unibanco, Bradesco, Gerdau, Santander, Globo, AmBev, Gol, Vale, Natura, McKinsey, Telefônica, DPaschoal, Microsoft e Abril, seguindo as diretrizes do Banco Mundial. Não se trata, então, apenas das vontades de um Executivo impopular ou de um Legislativo majoritariamente alinhado com a Presidência, falamos aqui de um grupo de bilionários e pessoas ligadas ao mercado financeiro que, através de seu braço social, pintam de filantrópicas suas estratégias de longo prazo: para um aumento dos seus lucros, a escola precisa servir mais adequadamente aos seus fins, produzindo o tipo de mercadoria adequada ao sistema que lhes serve, isto é, trabalhadores qualificados e subservientes. A MP 746 é uma deforma empresarial do Ensino Médio, o que coloca em cena um modo legalizado de corrupção: o aparelhamento da educação pública pelos gestores privados.

Não muito diferente da MP 746, está a Reforma da Previdência. Os grupos que dançam em cima dos direitos dos trabalhadores, pela articulação do secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano, são quase os mesmos que querem sambar na educação. Bancos como Itaú, Santander e Bradesco, além de representantes de fundos de investimento e fundos de pensões, foram recebidos inúmeras vezes pelo secretário, enquanto as centrais sindicais apenas uma vez, às vésperas da apresentação da proposta. A agenda do secretário, assim como o propósito da reforma, atende a um grupo bem específico, beneficiando exclusivamente os investidores e banqueiros, com destaque para a instituição líder no mundo em serviços financeiros e umas das maiores empresas do mundo, a estadunidense JP Morgan, conhecida por incentivar a inserção de práticas neoliberais na economia de países mundo afora. Segundo a Fenaprevi, representante das previdências complementares (privadas), a procura pelo serviço deve crescer 25% no próximo ano.

Nesse jogo de forças que coordena o governo de Temer, resta só o interesse dos grandes poderosos do mercado mundial. Enquanto os de cima sobem, os de baixo descem: a receita real das micro e pequenas empresas (MPEs) de São Paulo caiu pelo 21º mês consecutivo, por exemplo. Mesmo setores do mercado financeiro, muito alinhados com o impeachment, já falam publicamente sobre o “inferno astral” econômico. Se está difícil no meio da pirâmide econômica, para a classe trabalhadora que (a) sustenta isso tudo a realidade é ainda mais catastrófica. De um ano para cá, tivemos aumento de 3,6 milhões de pessoas desempregadas, somando total 12 milhões de pessoas no país. Se antes já parecia piada, agora não há mais como trabalhar sem pensar na crise!

Mas em qual crise pensamos? Além da econômica, atravessamos uma crise política, impulsionada em grande parte pelos escândalos reunidos pela Operação Lava Jato, que nos últimos dias atingiu a voadoras deputados e senadores, além de inúmeros ministros do atual governo e o próprio presidente ilegítimo. Altos nomes no PSDB, partido igualmente imbricado nas denúncias, já disputam internamente um afastamento do governo para não sujarem seus nomes. Enquanto isso, mantêm como carta na manga o pedido de cassação da chapa Dilma-Temer no TSE, que pode ser usado para tentar novas eleições e chegar ao poder de forma direta quando Temer for dispensável. Por meio das delações premiadas com executivos da empresa Odebrecht, caem um a um os aliados de Temer na rede dos corruptos. O interesse da empresa em manter certos parlamentares nos espaços representativos elucida o quão fraco é apostarmos na queda de uma só figura como garantia, pois, segundo um dos próprios executivos, a relação com representantes do legislativo é importante porque eles “apoiam projetos de nosso interesse e possuem capacidade de influenciar os demais agentes políticos”.

A Lava Jato, então, parece vir para reacender a esperança no cenário político, pois garantiria a limpeza nos espaços representativos. No cenário de escândalos, Sérgio Moro viria como o redentor: no último protesto na Avenida Paulista, no dia 04 de dezembro, via-se o boneco do Super Moro sendo carregado pelos manifestantes. Disfarçado de justiça, sustentando a falácia da imparcialidade, parte da população o deixa agir como se não tivesse lado, como se pairasse por cima dos interesses. Porém, esse juiz de Curitiba – com o poder do supersalário acima do teto da lei – não apenas emite mandado de prisão para corruptos, mas também ri e troca confidências com eles em premiação de revista, como vimos na foto do ano ao lado de Aécio Neves. Além da evidente parcialidade das investigações, Moro carrega a responsabilidade pelo atropelo da presunção de inocência e outras bases do Estado “Democrático” de Direito, assim como sustenta o chamado “pacote anti-corrupção” que dá enormes poderes aos Ministérios Públicos e Judiciário, estimulando o punitivismo e desprezo com que já tratam as classes oprimidas da sociedade. Na luta por um país mais igualitário, que não esteja na mão dos corruptores do poder econômico, não há salvadores da pátria, não há Sérgio Moro que retirará o povo de sua agonia. “O que transforma o velho no novo, bendito fruto do povo será”.

No entanto, se nós somos o povo, cadê a gente? A grande mídia tem dito muito que o povo foi às ruas, principalmente quando trata das manifestações do Movimento Brasil Livre e grupo Vem Pra Rua. Porém, não é o que a análise desses atos nos levam a concluir: primeiro, os números apontam que esses atos diminuíram muito em tamanho. Além disso, o perfil dos manifestantes era majoritariamente de pessoas velhas e brancas, um sub-setor bem específico da sociedade, com uma ampla gama de pautas, desde grupos contra o aborto até defensores do retorno da ditadura militar. Os próprios grupos organizadores trocaram farpas antes dos atos, mostrando que os setores que se uniram pelo impeachment não têm unidade no Governo Temer, apesar de continuar blindando o ilegítimo até então. É evidente que o “povão” ainda não foi à rua, em nenhuma das manifestações anteriores. É essa maioria popular que será o fiel da balança, mudando a situação de figura, caso se mobilize por um lado ou por outro. O que não há dúvidas é que o Governo Temer e o grande empresariado estão de panelinha no ataque a essa massa popular, trabalhadoras e trabalhadores, pessoas usuárias dos serviços públicos.

A realidade se apresenta dinâmica, caótica, mas também estimulante. Perdemos a batalha da PEC 55, mas a combinação entre crise econômica, desemprego crescente, Reforma da Previdência, assim como a desmoralização causada nas principais figuras políticas pelas delações da Lava Jato, proporcionam uma enorme indignação popular, capaz de extravasar a qualquer momento para um lado ou para outro.

Usaremos todos os nossos esforços contra a raiz de nossos problemas e não contra seus galhos podres. Não adianta tirar Michel Temer sem jogar na lata de lixo suas medidas liberais e privatistas. A luta é pelo SUS; pela educação pública crítica e abrangente; pelo direito à aposentadoria digna; pela demarcação das terras indígenas; pela auditoria da dívida pública; pela democratização da mídia; pelo fim da Polícia Militar. A luta não é contra um indivíduo, é contra uma estrutura de interesses e privilégios que não nos representa!

A SAÍDA É COLETIVA! Quando os de baixo se movem, os de cima caem!

E finalmente: LIBERDADE PARA RAFAEL BRAGA!

Frente de Arte e Resistência CENTOSPÉ
dezembro de 2016

Referências:

“Conheça os bilionários convidados para reformar a educação brasileira de acordo com sua ideologia” (The Intercept)

“Algo de podre no ar: quando as empresas elogiam a luta secundarista” (Passa Palavra)

“Agenda de secretário da Previdência é dominada pelo mercado financeiro” (Carta Capital)

“Previdência complementar deve acelerar em 2017, diz entidade do setor” (Folha)

“Empresários se desdobram para driblar quase dois anos de crise no Brasil” (El País)

“Frases do dia. A conjuntura do final de semana em destaque” (IHU Unisinos)

“Delação da Odebrecht revela troca de leis por doações a campanhas do PMDB” (El País)

“Com Temer, tucanos e famosos, Moro recebe prêmio e defende judiciário” (Folha)

“O pacote anticorrupção do STF e o fator Minority Report” (Lenio Streck)

“Sobre a Campanha Pela Liberdade de Rafael Braga”