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Carta à APG-UFSC

A passagem pela pós-graduação tem um ritmo próprio, muitas vezes cruel para quem participa do movimento estudantil. Tem períodos em que podemos estar mais presentes, e outros que nem tanto – mas, acima de tudo, a participação tem uma data de validade que costuma ser cumprida à risca.

São esses compromissos da vida e a dedicação a outros espaços de luta que infelizmente levaram a RP, a partir de junho de 2021, a se retirar da gestão “Assum Preto” da APG-UFSC. Neste momento em que se encerrou oficialmente aquela gestão e uma nova gestão começa, deixamos essa carta de memória e agradecimento em relação a toda a luta, o aprendizado e o companheirismo que construímos juntas às estudantes de pós-graduação.

UM LONGO CAMINHO

Nossa participação na APG-UFSC começou durante a gestão “Pra quem tem coragem!” (2017-2018), em meio à mobilização da entidade sobre notícias de que faltariam verbas para o pagamento de bolsas CNPq. De lá para cá, dedicamos nossos esforços para construir cotidianamente a entidade e a mobilização estudantil da pós em resistência a outros ataques contra a Universidade

Isso significou denunciar os avanços do capital privado na UFSC, buscar transformar o perfil branco e elitizado de quase a totalidade do corpo docente e discente, rejeitar o Ensino Remoto, resistir aos massivos cortes de bolsas de pesquisa, lutar contra o produtivismo e o assédio, exigir políticas de permanência, entre tantos outros assuntos que atravessam o cotidiano da pós-graduação e que precisam ser urgentemente abordados.

Defendemos essas pautas dentro de comissões e colegiados institucionais sempre que possível, mas o principal foi a agitação que buscava construir redes mais fortes de solidariedade e luta na própria categoria. Em 2019, por exemplo, foi histórica a greve que construímos em defesa da educação pública. De 2020 em diante, atravessamos a pandemia resistindo para manter viva a luta e o apoio mútuo. E, se este ano de 2021 foi marcado por grande desgaste, também foi nele que houve a conquista das ações afirmativas na pós da UFSC, que entendíamos como pauta prioritária desde 2017. Evidentemente, as políticas recém implementadas ainda não são suficientes para democratizar o acesso de negras, indígenas, quilombolas, LGBTIA+ e pobres na Universidade, o que evidencia que essa luta ainda tem muito a avançar.

PRESENÇA LIBERTÁRIA NO MOVIMENTO ESTUDANTIL

Não é comum ver uma força política libertária compondo a gestão de uma entidade central estudantil, muito menos ocupar esse espaço durante quase 4 anos, sempre como um setor expressivo em nossas chapas de aliança entre grupos do campo socialista. Por isso, consideramos importante explorar o contexto e a motivação dessa experiência de atuação.

Não é como se o movimento de pós-graduação fosse altamente estratégico para a construção do poder popular e da revolução social. Mas acreditamos que existe luta social a ser feita em todos os espaços onde se apresentam as contradições do sistema colonial-patriarcal-capitalista.

Durante esses anos, vimos a luta da pós-graduação ultrapassar o estereótipo raso de que o movimento estudantil apenas briga por entidades de pouca relevância. A APG-UFSC se tornou um pé importante na disputa pela universidade pública e popular, dentro de uma etapa histórica de resistência, em que predominaram as derrotas e não os avanços. Montamos gestões da APG com dezenas de pessoas, estimulamos a organização de base com assembleias regulares em alguns PPGs, puxamos greves e campanhas, levamos blocos para a rua sempre que havia atos e causamos muita dor de cabeça nas instâncias da UFSC, mesmo quando a correlação de forças era bem desfavorável. Como maior entidade de pós-graduação de Santa Catarina, também fomos além da UFSC e demos força à luta pela prorrogação das bolsas Fapesc durante a pandemia e por investimento público na ciência catarinense.

Existem vários motivos conjunturais para isso ter sido possível. O crescimento geral da categoria; o aumento da parcela de jovens desempregadas que vieram para a pós como horizonte de sobrevivência; os cortes anuais nas bolsas; as pressões produtivistas. Outro fator é que a pós-graduação se conformou como ponta-de-lança das iniciativas privatistas na universidade pública, como vimos na pressão pelos cursos pagos, na entrada do ensino remoto, assim como nas relações íntimas entre empresas privadas e o direcionamento das pesquisas.

Sabemos que apenas uma direção de entidade não irá resolver todos os problemas da pós-graduação ou da Universidade. Isso depende de muita força social e um acirramento nas disputas contra os de cima, o que somente será alcançado com a mobilização ampla da categoria e com a articulação com outros setores oprimidos. A APG teve importância para nós como um primeiro passo de mobilização e articulação na pós-graduação, em um cenário de enorme isolamento da categoria. Um primeiro espaço que deve ser ocupado para chegarmos à Universidade que sonhamos, feita pelo e para o povo, socialmente referendada, preocupada com as necessidades populares.

Mas com ou sem a entidade, é apenas sob essa condição que o movimento estudantil pode ser uma força crucial na construção de um povo forte: quando consegue disputar as instituições educacionais no sentido das demandas do conjunto das classes oprimidas.

Aprendemos com a luta na pós-graduação que os ritmos de militância, assim como algumas pautas e identidades, são diferentes da graduação. Também vimos que a falta de referência organizativa do movimento estudantil de pós não é uma lei do universo nem uma imposição da atual estrutura universitária. Com trabalho de base e uma adequada linha política de agitação e organização, vimos estudantes da pós se reconhendo como sujeitos políticos e se mobilizando para transformar sua realidade.

Enquanto força libertária que compôs a APG-UFSC, nossa preocupação maior foi sempre a construção cotidiana e fazer avançarem as lutas, adotando posturas encaminhativas, combinando atuação junto à base e apostando em ação direta. Nosso interesse nunca foi a disputa para alcançar postos e/ou cargos de direção (que não existiam, na prática, enquanto atuamos na APG), nem conquistar referência política individual para as militantes da RP ou falar em nome de outras estudantes da UFSC. Contamos nesses anos com uma saudável – e rara – cultura de aliança entre diferentes grupos sob um programa de linha socialista e espaço efetivo para as lutadoras independentes, com honestidade e decisões de base.

Acreditamos que essas práticas – a gestão aberta, horizontal, colaborativa – tenham contribuído pra fazer da gestão um espaço acolhedor, um solo fértil onde práticas de resistência e transformação puderam florescer nos últimos anos. Nossa participação se encerra aqui, mas esperamos que tenha semeado um futuro tão formativo e combativo quanto o tempo que atuamos na entidade.

O FUTURO DAS LUTAS DA PÓS

O ano de 2022 está próximo e, com ele, virá o retorno das aulas presenciais e certamente uma retomada das mobilizações estudantis que se enfraqueceram durante esse período. A pós-graduação continuará, como vem sendo, a ponta de lança dos avanços privatistas e precarizantes da Universidade, como as recentes mudanças estruturais aprovadas na CPG e Conselho Universitário já demonstraram.

Quem vai enfrentar esse cenário será a chapa “Carcará”, única inscrita para a gestão da APG-UFSC (2021-2022). Convidamos todas as estudantes a conhecer seu programa de gestão e votar nela no dia 07/12. A chapa “Carcará” apresentou em seu programa político a proposta de manter uma gestão aberta e colaraborativa. Por isso, mais do que votar, aproveitamos esse texto para convidar todas as estudantes de pós-graduação da UFSC a construir a próxima gestão da APG.

A Resistência Popular não está mais no dia a dia da entidade, mas as militantes que passaram pela APG seguirão nas lutas em outros espaços e acreditamos que podemos contar com ela como parte de um campo político anticapitalista. A construção de uma Universidade que receba as classes oprimidas e que faça pesquisa, ensino e extensão a favor de suas necessidades coletivas é uma luta histórica, que começa com cada estudante de pós-graduação, mas que envolve todos os movimentos sociais. Seguimos na luta seguras de que a vitória nos espera.

MAIS FORTES SÃO OS PODERES DO POVO!

Eleições Reitoria e Carta de Reivindicações Discentes da Pós-Graduação

Publicação original na página da APG-UFSC em 21/03/2018

A consulta pública para a Reitoria da Universidade Federal de Santa Catarina aconteceu no dia 28 de março de 2018. A convite da APG, estudantes dos cursos de Pós-Graduação da UFSC construíram coletivamente uma carta de reivindicações a serem apresentadas aos candidatos, que passou por um processo inicial de levantamento de pautas de reivindicações via formulário online e posterior discussão e aprovação das mesmas em assembleia realizada no dia 14 de março de 2018. A carta pode ser acessada aqui.

As lutas da pós-graduação na UFSC e o papel da APG

A Associação de Pós-Graduandos da UFSC é a entidade que representa e mobiliza estudantes de pós em todos os campi da UFSC, nas modalidades residência, especialização, mestrado acadêmico, mestrado profissionalizante e doutorado. Em 2016, éramos mais de 14 mil estudantes, dos quais cerca de 7 mil são de mestrado e doutorado acadêmico. Neste momento, a entidade está em processo eleitoral, em que concorre apenas a chapa “Quem tem coragem!“, que estamos construindo junto a outras estudantes de correntes de esquerda ou independentes.

No dia 16 de outubro, o jornal UFSC à Esquerda publicou um texto discutindo a importância da unidade nas lutas nesse período que vivemos e sugerindo que, por isso, a pós-graduação poderia estar dentro do DCE ao invés de organizada na APG. Nós, da Coletiva Centospé, gostaríamos de discutir essa proposta mais a fundo, apontar motivos para manter a APG enquanto entidade e, mais especificamente, explicar por que decidimos construir a chapa “Quem tem coragem!”.

Unidade sem luta, luta sem unidade

É verdade que a separação das entidades estudantis não é a única forma possível de organização estudantil, nem que será necessariamente a melhor opção em qualquer momento histórico. No aniversário de 100 anos da Greve Geral de 1917, lembramos das propostas do Sindicalismo Revolucionário, que estimulou a fundação de muitos de nossos primeiros sindicatos e foi responsável por muitas das maiores conquistas de nossa classe: antes do atrelamento dos sindicatos ao Estado, muitos deles foram ferramentas de luta que não eram restritas a uma única categoria. Com isso, promoviam a consciência e solidariedade de classe, inclusive realizando greves solidárias às reivindicações de outras categorias. Com isso, o Sindicalismo Revolucionário apontava para um método comum de luta, através da Greve Geral, e um horizonte de conquistas que contemplasse todas e todos os trabalhadores.

Também é verdade que estudantes de pós-graduação estão na mesma categoria que estudantes de graduação, embora muitas vezes não se reconheçam na luta do movimento estudantil. Porém, a questão é como superar essa situação e construir um movimento forte na pós, capaz de somar forças às demais lutas da Universidade. A realidade que enfrentamos como estudantes de pós envolve várias especificidades.

A forte pressão produtivista e a natureza da relação de orientação possibilitam formas muito próprias de assédio moral e sexual, estresse ou exaustão. Os dados sobre assédio e saúde mental na pós-graduação brasileira demonstram uma verdadeira epidemia. Ao contrário da graduação, geralmente não mantemos uma relação próxima com nossa turma de ingresso, particularmente após o primeiro ano de curso, e a realidade de uma ampla parcela de estudantes vindas de outras cidades conforma uma situação de grande isolamento: dentro do núcleo/laboratório ou mesmo na solidão junto a livros, artigos e computador.

As bolsas atuais, cujo valor não é diretamente vinculado às bolsas da graduação, são indignas para quem já dedicou vários anos aos estudos, na maioria dos casos trabalhou fora da Universidade e precisa, muitas vezes, sustentar uma família – o que certamente acontece na graduação também, mas não na mesma proporção. Com isso, a luta por bolsas se une à luta contra o desemprego ou a precarização de sub-empregos que acumulamos junto aos auxílios da CNPq e CAPES. Na prática, o trabalho científico no Brasil não é tratado como emprego, pois é feito majoritariamente por bolsistas – quando não é sustentado pelas famílias de quem pode pagar. Somos trabalhadoras e trabalhadores da produção de conhecimento, mas não temos direitos trabalhistas ou previdenciários básicos e recebemos muito menos do que nossos pares em outras profissões.

O tempo que estudantes de pós-graduação passam na Universidade – 2 anos no Mestrado, 4 anos no Doutorado, mas muitas vezes afastado em parte desse período – sugere outra dinâmica de organização, assim como o nível de exigências e tarefas acumuladas pelos motivos citados acima. Não é plausível, portanto, esperar o mesmo ritmo de militância que é comum na graduação, onde chegamos a realizar várias reuniões por semana. Atrasar disciplinas ou se organizar para ter “semestres mais leves” simplesmente não acontece.

Hoje a luta na pós-graduação é tocada principalmente por quem já participou do movimento estudantil na graduação e, muitas vezes, por quem ainda mantém vínculo e relação política com a luta de outras categorias da Universidade. Se, por um lado, este perfil é de um sujeito com experiência e compromisso, também é um perfil minoritário entre nossa categoria.

Se ainda não aproximamos setores mais amplos da pós-graduação nem temos uma cultura de luta bem consolidada, precisamos cultivá-la a partir do trabalho de base em cima das nossas demandas mais urgentes. Isso exige construir identidade com tantas e tantos estudantes que vivem as situações descritas acima e dedicar nosso tempo nessas lutas. Frente a essa situação, avaliamos que apenas somar nosso processo de organização ao DCE reforçaria muitas das dificuldades encontradas hoje para mobilizar a pós, pela diferença de pautas, pelo ritmo próprio e principalmente pela falta de identidade.

Não defendemos, com isso, que a unidade é indesejável, nem que o projeto de Universidade desenvolvido na luta da pós seja necessariamente distinto daquele construído entre as demais lutas sindicais ou estudantis da UFSC. O que apontamos como tarefa para o momento atual é mobilizar a partir das pautas mais imediatas e urgentes de nossa categoria como condição para criar cultura de luta, reforçar contatos, formar um caldo. A tarefa da militância é fazer a relação entre o imediato e o geral, entre as necessidades básicas que podem movimentar esse sujeito e o projeto mais amplo de Universidade, que disputaremos necessariamente junto às outras categorias. Ou seja, é nosso compromisso interpretar nossas lutas dentro de uma estratégia mais ampla e coletiva.

Confiamos menos na estratégia inversa, onde primeiro se estabelece a unidade por cima, para depois tentar mobilizar. É o processo concreto de reivindicações que demonstra da melhor forma a necessidade fundamental da articulação entre todos os setores de luta na Universidade. A partir do foco nas questões específicas de estudantes da pós, nossa mobilização pode inclusive avançar nas propostas e programas específicos de nossa realidade, dando uma contribuição mais sólida para o projeto de Universidade que precisamos construir enquanto setores oprimidos – estudantes secundaristas, de graduação, de pós-graduação, trabalhadoras e trabalhadores terceirizadas, servidoras e servidores técnicos e docentes, comunidades do entorno da Universidade e movimentos sociais da região.

APG para quê?

Até agora, defendemos a existência da APG enquanto entidade na presente conjuntura. Mas por que assumimos a tarefa de participar de uma chapa e fazer parte da gestão da entidade? O que esperamos que ela faça? Não podemos lutar da mesma forma sem a entidade?

Entendemos que é momento de reforçar as campanhas em defesa das Ações Afirmativas nos programas de pós-graduação, onde as políticas que buscam democratizar o acesso para estudantes negras e negros, indígenas e pobres ainda não chegaram ou tiveram pouco efeito. No entanto, alguns Programas pelo país já implementaram essas ações afirmativas, inclusive na UFSC, e vários outros estão no processo de reivindicação por elas, o que demonstra que é hora de avançar. Sem esses sujeitos em peso na pós, continuaremos com o perfil de quase totalidade de docentes brancas e brancos nas Universidades e não haverá produção de conhecimento verdadeiramente crítico e a serviço do povo.

Fora essa pauta que representaria uma nova conquista, estamos em uma conjuntura de resistência, de luta contra os retrocessos. Isso significa enfrentar os avanços do capital privado na Universidade, das parcerias público-privadas, convênios e também as medidas que anunciam a derrota do princípio de Universidade pública, como as cobranças nas pós-graduações. Temos necessárias lutas contra o produtivismo, assédios, na demanda por políticas de saúde mental, em defesa das bolsas, das políticas de permanência, enfim, tudo que aprovamos no programa de chapa. Fora isso, se queremos lutar pela produção de conhecimento a partir das necessidades populares, precisamos ser também um ponto de apoio aos movimentos sociais e comunidades que estão fora da Universidade, trazer suas demandas e projetos para dentro da instituição.

A direção da entidade não vai alcançar essas conquistas. Elas dependem de força social e disputa. Só a mobilização ampla da nossa categoria e a articulação com outros setores pode alcançá-las. É uma tarefa que envolve o conjunto de estudantes, mas que a entidade pode ajudar a mobilizar. Dentro do nosso contexto imediato, poucos programas de pós realizam suas assembleias ou se organizam além da escolha da representação discente. Foi a entidade que mobilizou as principais ações no último período, é ela que tem espaço de representação frente à instituição e que tem maior legitimidade e capacidade para fazer trabalho de base e puxar novas campanhas.

Nessa terça-feira (31) é a votação para a chapa “Quem tem coragem!”, através do site https://capg.ufsc.br. Embora sejamos chapa única, a declaração de apoio à chapa e a votação na terça-feira são importantes demonstrações de apoio para esse programa. Em tempos de retrocessos políticos, em que vemos a organização de setores conservadores e de extrema-direita na Universidade, é fundamental somar forças em um projeto popular, crítico e transformador. Quem tem coragem?

Vote “Quem tem coragem!”: https://www.facebook.com/events/150020025611411/