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3 anos da Ocupa CCB e das ocupações de 2016

No segundo semestre deste ano, completamos três anos das ocupações que tomaram a UFSC em 2016, entre elas Ocupa CCB, em resposta as medidas neoliberais de Michel Temer, como a então PEC da Morte ou do Teto de Gastos (atual Emenda Constitucional 95).

Nós somos frutos do transbordamento da Ocupa CCB, espaço que construímos e que muito nos formou. São inúmeros momentos muito bonitos de luta e resistência, com fortes laços sendo tecidos, que foram parte da ocupação. Assim, saudamos, com o coração repleto de amor e rebeldia, as lutas daquele ano na UFSC, em outras universidades e em milhares de escolas do Brasil.

MAIS FORTES SÃO OS PODERES DO POVO!

Segue abaixo o Manifesto Ocupa(do) CCB.

Manifesto escrito em 23 de novembro pelo movimento Ocupa CCB UFSC, entregue para a Direção do CCB e lido na histórica Assembleia Estudantil do dia 24 de novembro.

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Paulo Leminski

Ocupamos! No dia 16 de novembro de 2016, os corredores e salas do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia e prédios associados (MIP/CCB/UFSC) foram convidadas à vida, dias depois de uma assembleia com cerca de 200 pessoas, na qual decidimos paralisar nossas atividades curriculares e ocupar nosso prédio. Deste modo, conseguiríamos força, união e tempo para estudos de toda a gama de projetos de lei e medidas provisórias que vem sendo colocados com rapidez, inclusive com a defesa explícita dos aparatos midiáticos, dificultando a compreensão da maioria da população do país sobre as proporções de mudanças que estão postas.

Assim, dos brancos e frios corredores, fizemos surgir cartazes com cor, mensagens de resistência, sonhos, esperança, força e amor. O MIP não era mais o mesmo prédio: re-significamos. O que era mera sala de aula, fizemos virar sala de criar, de estudar política, de reunir e de sonhar. Salas de resistir contra o projeto de sociedade proposto pelo governo ilegítimo de Michel Temer, em uma onda de retrocessos e perdas de direitos sociais que não passou pelas urnas, mas foi orquestrada pelo projeto neoliberal hegemônico no mundo e que tem avançado a passos largos. Nossa tática foi ocupar, como fizeram os secundaristas no Chile, em 2006, seguidos pelos estudantes paulistas no ano passado, ambos vitoriosos. Nesse semestre, somos mais de mil ocupações no país, entre escolas, institutos e universidades, entre as maiores ações do movimento estudantil já observadas na história. E nós fomos parte disso. Nós somos parte disso: daqueles e daquelas que lutam e resistem contra um projeto que tem base em um ideal meritocrático, que beneficia aqueles a quem o privilégio já é a norma, que enriquece ainda mais os que já detêm poder. Daí o porquê de ocupar: mostrar que aquilo que eles pretendem tratar como simples propriedade privada, como mera mercadoria, é muito mais que isso. Trata-se do que é nosso por direito! E não deixaremos que tirem de nós e das próximas gerações para sustentar bancos, corporações, especuladores e políticos. Iremos resistir!

O que construímos durante esses dias ecoará pelas paredes desse prédio para além de nossa estadia aqui. Mostramos que é só habitando um espaço, fazendo dele local significativo e afetivo, que entendemos as demandas que emanam dele. Neste período em que estamos ocupando o Centro de Ciências Biológicas (CCB), conquistamos coisas que nunca teriam sido alcançadas com a rotina habitual e corrida de aulas. Laços entre os estudantes de diferentes turnos e turmas foram criados e fortalecidos. Fizemos conversas entre discentes e docentes, que se deslocaram dos campos específicos da Biologia para seus âmbitos políticos gerais. Este movimento nos permitiu perceber os posicionamentos da comunidade do CCB, as posturas e engajamento das biólogas, biólogos e educadores da nossa universidade.

Reconhecendo-nos enquanto categoria, buscamos legitimar nossa decisão perante os docentes, que em alguns casos mostraram apatia frente à conjuntura atual e ao movimento, insistindo em desrespeitar as decisões tomadas por nossa assembleia estudantil e ignorando o movimento que assola a universidade. Fomos firmes em nossas deliberações, paralisar e ocupar, e assim o fizemos. Buscamos mostrar aos professores que a resistência só se faz com autonomia e que era possível romper a inércia da categoria. Sentimos que fomos reconhecidas(os) por muitos enquanto membros articulados (artrópodes?), que juntos tecemos teias de apoio mútuo para enfrentar o corte de direitos. A solidariedade desses professores chegou a nós de diversas formas: espaços de formação, carta de apoio, e-mails de motivação, ajuda financeira, visitas na ocupação, entre outras atitudes que reafirmaram: a luta é maior quando estamos juntas(os)!

Construímos uma programação de atividades para que a ocupação fosse, também, do nosso pensar. Estudamos a PEC 55, a Medida Provisória do Ensino Médio (MP 746), o projeto de lei Escola Sem Partido, chamando economistas, educadoras(os), advogadas(os). Lemos os documentos, buscamos textos e vídeos informativos, procuramos entender o que é a dívida interna e externa, o que é a medida provisória e quais serão os impactos desse projeto de sociedade para os serviços públicos: como as professoras e professores são afetadas(os), como a ciência é afetada, como as e os estudantes são afetadas(os), como as negras e negros, bem como populações indígenas, comunidades tradicionais e quilombolas desse país são afetadas(os). Foi possível adentrar as discussões políticas sobre legitimidade de assembleias, pensar e fazer materiais para que esse acúmulo pudesse romper os muros da Universidade. Sentimos, escrevemos, expressamos, criamos um grupo de teatro de rua. Saímos também do CCB para fortalecer a luta secundarista da cidade que protagoniza a mobilização no país. Fortalecemos também os contatos com professoras, professores, técnicas, técnicos e trabalhadoras(es) terceirizadas que compartilham esse espaço conosco e também a luta contra os retrocessos no país. Foi criada uma rede micelial que conecta, que troca, que fortalece, que expande. Lançamos esporos.

Cheios e repletos de tudo que significou essa semana, realizamos na noite de domingo uma reunião com pauta única: Horizontes. E assim, levando em conta a nossa vontade de quebrar os muros que separam a Universidade do povo, a urgência de fortalecer os movimentos populares e a luta das e dos trabalhadoras(es), considerando também que estamos em um cenário de final de ano e esvaziamento da Universidade, decidimos por TRANSBORDAR.

Transbordar: estar repleto e exceder, ir além. Tudo o que construímos já não nos cabe mais, excedeu e precisa atingir outros espaços. Rompemos as paredes, os muros e agora rumamos para fora do CCB. A rua nos chama para uma vida de militância e resistência. A “Ocupa CCB” não terminou por aqui, pois é aqui que ela tem início: quando nossos corpos deslocam-se do caminho conhecido e tomam as ruas, os morros, a cidade. A ocupação é um meio, não um fim. Nosso horizonte de sociedade parte dos princípios com os quais construímos essa ocupação: autogestão, apoio mútuo, autonomia e amor.

Citando nossas irmãs e irmãos da UDESC, após a reintegração da Tenda da Democracia, “a paz do silêncio não é paz, é medo”; não nos deixemos calar frente aos retrocessos que estão por vir. Devemos lembrar que somos sujeitos políticos, críticos, que tomam a ação de refletir e se posicionar frente a uma estrutura socioeconômica que inibe e negligencia nossos sonhos e possibilidades. Romperemos as barreiras espaciais e temporais da OCUPA CCB, continuamos e continuaremos na luta, na persistência e na resistência, para nos projetarmos nestas lutas que nos esperam. Transbordamos para uma vida de resistência.

Entendemos que este período foi essencial para nossa formação e para a criação de uma identidade como grupo, e esse processo de transformação tornou o CCB muito pequeno para o que fizemos de nós. Co-criamos, assim, um coletivo que transborda o CCB, e gostaríamos de agregar todas e todos que estão indignados com o atual momento para somar com a gente nesse movimento. Na sexta-feira, dia 25 de novembro de 2016, estaremos transbordadas e transbordados, fortalecendo a luta das e dos trabalhadores do país no dia de paralisação nacional. O MIP voltará a ter seu acesso pela porta costumeira, no entanto, ele já não é mais o mesmo; em seus cantos ecoam nossos cantos. Nosso micélio invadirá as ruas e não sairá dela até que nossa voz seja ouvida. Entendemos que a força da classe dominante é grande, mas que o poder popular é capaz de balançar até derrubar os retrocessos vindos de cima: quando os de baixo se movimentam, os de cima caem. Com isso estaremos nas ruas, nos bairros, nos centros comunitários e nas escolas dando continuidade a nossa luta.


Nosotros

seguimos creyendo
en los asombrosos poderes
del abrazo humano.
Eduardo Galeano

Assinam as e os ocupantes,
Ocupa CCB
23 de novembro de 2016

Nota de solidariedade às lutadoras da UDESC

A administração central da UDESC solicitou à Procuradoria Geral do Estado (PGE-SC) a abertura de uma sindicância para descobrir quem participou do fechamento do Campus I, em Florianópolis, no dia 14 de junho, durante a mais recente Greve Geral.

Com isso, a reitoria de Marcus Tomasi demonstra de forma explícita que prefere atacar quem está ao lado da universidade, suas trabalhadoras e estudantes, do que se indispor com os governos federal e estadual, ambos na mão do PSL, que vem implementando um projeto de desmonte brutal do que ainda resta de serviços públicos no país. Quem está ameaçando o direito de estudar não são as lutadoras do 14 de junho, mas os governos que retiram investimentos das universidades públicas federais e também estaduais. Quem está impedindo o direito de trabalhar são os patrões e governos que gerenciam o atual cenário de retirada de direitos e ampliação do desemprego para aumentar seus lucros. Quem realmente planeja impedir o direito de ir e vir são aqueles que defendem a Reforma da Previdência, que nos obrigará a trabalhar até morrer, ou aqueles que apoiam o Pacote Anticrime de Moro, que planeja dar plena licença para a polícia matar, aumentando ainda mais o genocídio do povo negro e pobre promovido pelo Estado.

Ao buscar identificar quem se mobilizou para lutar contra a Reforma da Previdência e contra os bloqueios de verba na educação, ao invés de se juntar à luta pela educação pública e por uma previdência solidária, a administração central da UDESC está dizendo que protestar é crime e que as servidoras e estudantes que ousaram fazer greve no dia 14 de junho são suas inimigas.

Entendemos essa abertura de sindicância na UDESC como uma ameaça a quem faz luta estudantil e sindical na universidade e, dessa forma, uma ameaça também a todas nós lutadoras que construímos a Greve Geral em Florianópolis. As companheiras da UDESC que participaram das atividades do 14J sabem que nossos direitos só se conquistam com ação direta – foi assim que vencemos alguns dos ataques sofridos nos últimos anos e será assim que vamos resistir aos ataques atuais à educação e aposentadoria do povo.

Estivemos juntas nos grandes atos de maio deste ano, estivemos juntas na Greve Geral de 14J e estaremos juntas também nas próximas mobilizações. Enquanto houver universidade pública, lutaremos pra que ela seja do povo.

LUTAR NÃO É CRIME!

É BARRICADA, GREVE GERAL, AÇÃO DIRETA QUE DERRUBA O CAPITAL!

Leituras complementares:

Racista e antipovo: como o pacote anticrime de Sérgio Moro fortalece a política de criminalização de movimentos sociais, o genocídio do povo negro e o processo penal inquisitivo
https://reporterpopular.com.br/racista-e-antipovo-como-o-pacote-anticrime-de-sergio-moro-fortalece-a-politica-de-criminalizacao-de-movimentos-sociais-o-genocidio-do-povo-negro-e-o-processo-penal-inquisitivo/

[Parte 1] Como a reforma da previdência ataca direitos de trabalhadores/as e beneficia o mercado de capitais
https://reporterpopular.com.br/parte-1-como-a-reforma-da-previdencia-ataca-direitos-de-trabalhadores-as-e-beneficia-o-mercado-de-capitais/

Dia 15 de maio marca o início de um novo ciclo de lutas pela base
https://centospe.libertar.org/2019/05/14/dia-15-de-maio-marca-o-inicio-de-um-novo-ciclo-de-lutas-pela-base/

Por um DCE construído de baixo para cima: propostas para o Regimento do CEB

O Conselho de Entidades de Base (CEB) é uma ferramenta importante na construção da mobilização estudantil. A existência de um Regimento para o CEB pode cumprir um papel importante por apresentar a natureza deste Conselho e explicitar os meios justos para seu funcionamento, como convocatórias, quórum e formas de deliberação. No entanto, o processo de elaboração do Regimento deve representar um acordo construído no movimento estudantil. Ao contrário disso, a Diretoria do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFSC afirma um acordo consigo mesma sobre uma proposta elaborada por apenas um Centro Acadêmico (CA), buscando aprová-la o mais rápido possível, sem considerar o desgaste consequente para as lutas do movimento estudantil

Até o momento, já foram convocadas 09 reuniões de CEB tendo como pauta única a discussão da proposta regimentarsendo que 03 delas não atingiram quórum mínimo de apenas 16 CAs e inúmeras foram incapazes de votar um ponto sequer, restando ainda 13 artigos com destaques pela frenteTrata-se de um documento composto por 20 artigos, mas incompleto para regimentar um espaço em constante disputa, o que ainda nos leva a ter pela frente a discussão de sugestões e críticas a pontos ausentes. Nesse processo, Centro Acadêmico Livre da ArquiteturaCentro Acadêmico da BiologiaCentro Acadêmico Livre da Psicologia – três dos CAs mais atuantes no movimento estudantil da UFSC – já lançaram notas críticas à proposta e à forma como a Diretoria do DCE vem tocando a discussão.

A Coletiva Centospé tem acompanhado os debates sobre o Regimento e entende que o processo longo e improdutivo, desde a reformulação do texto às votações, é consequência da falta de discussões aprofundadas sobre a natureza do Conselho e seus objetivos. Há uma tentativa da Diretoria do DCE em “mostrar serviço” através da produção de um Regimento que sirva como legado da gestão, o que compromete todo o movimento estudantil com uma pauta arrastada e cheia de atropelos.

Para resistir em defesa de uma Universidade Pública e Popular, a militância estudantil precisa dar centralidade às mobilizações. Nas últimas semanas, vivemos momentos importantes na luta por moradia estudantil, no caso da postura racista da diretora do CFH (Centro de Filosofia e Ciências Humanas) com as estudantes indígenas, no corte nacional às bolsas permanência indígena e quilombola,  na luta contra as fraudes nas Ações Afirmativas raciais. São apenas alguns exemplos de pautas que não podem ficar restritas às reuniões amplas da Diretoria do DCE, que não possuem tradição de agregar as diferentes forças políticas da UFSC. Enquanto isso, um espaço de luta legitimado como o CEB é condenado a uma agenda burocrática em torno de si mesmo.

Nós acreditamos que um movimento estudantil forte não se constroi a partir da direção das entidades representativas, por isso não compusemos nenhuma chapa nas eleições à Diretoria do DCE. Buscando dialogar com as bases do movimento estudantil e contribuir com o debate dos Centros Acadêmicos e forças políticas da Universidade, faremos algumas considerações sobre princípios que implicam outra forma de enxergar o Regimento do CEB.

Autonomia das entidades de base

Cada entidade de base é resultado dos acordos e acúmulos feitos no movimento estudantil de seu Curso, na diversidade de suas lutas e debates, o que garante, por exemplo, a legitimidade de CAs autogestionados sem processo eleitoral é a sua própria base; por isso, não cabe à Diretoria do DCE o controle sobre as formas organizativas de cada CA. Além disso, o Conselho é orgão fiscalizador do DCE, não das entidades de base, então não é pertinente que ele legisle sobre como cada CA deve enviar representantes ou garantir que sua representação seja legítima.

Segundo o Estatuto do DCE, o CEB é um órgão administrativo do DCE (assim como a Diretoria, a Assembleia Estudantil e o Congresso Estudantil) e possui caráter deliberativo, consultivo e fiscalizador. A Diretoria é apenas o órgão executivo do DCE e o CEB está acima dela, ao mesmo tempo em que o Conselho está submetido apenas às Assembleias e Congressos. Dessa forma, também não cabe à Diretoria do DCE o controle sobre o CEB, nem a garantia de mesa das sessões, uma vez que o CEB parte das entidades de base.

Aliás, cabe ressaltar que, ao contrário do que se costuma dizer, o DCE não é a Diretoria; toda estudante faz parte do Diretório.

CEB como instrumento de luta

O CEB serve para organizar as lutas do movimento estudantil, então o seu engessamento não pode estar previsto no Regimento. É necessário garantir a liberdade para discutir qualquer assunto que for sugerido como pauta, cumprindo o acordo de quórum para a sessão, sem ferir a autonomia dos CAs em deliberar sobre os temas que se julgar pertinentes em determinada conjuntura.

Um Regimento que não compreenda essa dimensão e não dialogue em sua concepção com a natureza de mobilização do Conselho, cai em uma burocratização que pode impedir a ação efetiva nas situações reais. É necessário garantir ao CEB a agilidade necessária para mobilizar lutas e lidar com qualquer emergência que aparecer pela frente, permitindo a convocação pelas entidades de base e a inclusão de pautas emergenciais fora do prazo, desde que seja resguardado algum mecanismo de veto a uma pauta sem a antecedência necessária.

Todo poder ao CEB

Uma reunião de CEB, organizada com pauta em antecedência, convocação aberta e quórum de CAs para tomar decisões, é muito mais legítima e democrática que uma reunião interna de Diretoria, onde podem estar poucas estudantes e sem uma representação significativa dos cursos – o mesmo vale para as reuniões abertas, como tem realizado a atual gestão. Por isso, defendemos que o CEB tem legitimidade para tomar qualquer decisão dentro dos limites do Estatuto e das posições de Assembleias e Congressos, o que envolve todas as ações da Diretoria.

Isso significa, por exemplo, que o CEB tem legitimidade para tirar notas de posição e organizar atividades em nome do DCE, deliberar sobre o uso do dinheiro, decidir sobre as posições a ser levadas nas instâncias universitárias e tomar ações a respeito dos seus espaços físicos.

Através da autonomia e do poder devidamente localizados nas entidades de base, temos um incentivo para sua construção e fortalecimento pelas forças do movimento estudantil, reforçando a importância da presença dos Centros Acadêmicos. Essa mudança de percepção da relação CEB-DCE valoriza o esforço de quem está efetivamente construindo as lutas no cotidiano e vivenciando as bases.

Quanto mais poder o Conselho possuir, menor é a pressão para que se jogue toda a força do movimento estudantil nas eleições da Diretoria do DCE, o que inclui os gigantescos gastos financeiros e de tempo envolvidos. Diminui também, automaticamente, a pressão para construir chapas com centenas de membros, onde na prática a grande maioria não vai construir a gestão, além de perder força a tática desleal de organizações políticas de trazerem militantes de fora da UFSC para ajudar nas campanhas – que não agrega em nada para a luta.

Horizonte organizativo do Movimento Estudantil

Defendemos esses princípios para subsidiar a construção coletiva de uma nova proposta de Regimento para o CEB, mas sabemos que eles também apontam em direção a uma transformação fundamental para o DCE e para o movimento estudantil da UFSC: o abandono do modelo de Diretoria eleita e adoção da gestão cotidiana da entidade através das entidades de base, em reuniões do ConselhoLembramos que o DCE UFSC já funcionou durante um semestre inteiro sem Diretoria em 2011, organizado a partir de reuniões do CEB, uma experiência em que a entidade manteve seu bom funcionamento.

Esse horizonte é importante para nós porque traz consigo uma pedagogia da ação direta, em que não delegamos nossa capacidade de intervenção política para uma Diretoria que fala em nosso nome, mas fortalecemos a lógica de que é preciso fazermos nós mesmos o que queremos que seja feito. Para nós, é isso que significa o lema de fazer por nossas mãos tudo que nos diz respeito“.

Existe um papel importante cumprido pelas eleições anuais do DCE, que é o debate sobre o projeto de movimento estudantil e o projeto de Universidade que nós queremos. Porém, quando estamos elegendo pessoas e não diretamente os projetos, existe um forte rebaixamento da política para a lógica eleitoral, onde se criam falsas alianças para entrar melhor na disputa pelo cargo e se defendem determinadas propostas com fim exclusivo de atrair votos, sem real interesse em construir essas ações. Sugerimos transformar a eleição da Diretoria em um Congresso de Estudantes da UFSC, quando se debatem e aprovam teses.

Com uma eleição de teses  propostas políticas práticas, e não um conjunto de pessoas (chapa)  o debate passa a girar em torno das pautas, sem necessária formação de blocos ou alianças. Assim, perdem espaço os votos personalistas, as manobras eleitorais e o posicionamento interesseiro das chapas para convencerem estudantes alheias ao debate a votar em cima da hora. Por sua vez, o que ganhamos com essa forma organizativa é a possibilidade de focar os debates sobre os projetos de Universidade e as lutas que precisamos para construí-los, contando com a força e a presença de quem está disposto a trabalhar, não de quem apenas busca o controle das entidades representativas.

O que defendemos aqui é um horizonte de auto-organização e construção desde a base no DCE. O movimento estudantil é a ação conjunta das estudantes para transformar a realidade. Com as práticas de autonomia, participação direta e combatividade é que se constroi uma educação a serviço do povo e uma nova sociedade.

Coletiva Centospé

Florianópolis, 21 de junho de 2018

Quem é Michel Temer na fila do pão?

Artigo escrito a partir das oficinas de análise de conjuntura realizadas nas primeiras semanas de dezembro de 2016 pela mobilização estudantil da Biologia – UFSC, que ocupou o Centro de Ciências Biológicas da UFSC e deu origem à Frente de Arte e Resistência CENTOSPÉ.


“Bater no governo
É coisa do passado
Agora a moda é
No empresariado!”

Primeiramente… primeiramente o quê?

O grito “Fora Temer” ecoou por todas as manifestações populares desde o impeachment. Mais do que isso, essa chamada tomou os muros das cidades, fez parte das músicas e manifestos das escolas ocupadas, roubou segundos de televisão nas invasões das entrevistas ao vivo. “Fora Temer” também esteve presente nas diversas manifestações das artes capazes de refletir seu próprio tempo – para usar as palavras de Nina Simone sobre a essência do fazer artístico.

Agora que temos novas palavras de ordem competindo como elemento unificador das lutas – “Fora PEC 55”, “Contra a MP 746”, “Contra a Reforma da Previdência”, etc. – cabe perguntar: a que propósito serve o chamado por “Fora Temer”? Além de Temer, quem são os agentes por trás desse pacote de maldades em forma de programa de governo? O que quer Sérgio Moro e a Lava Jato? Qual o controle de Temer e do PMDB sobre os outros grandes partidos na Câmara e no Senado? Qual o papel dos grupos que puxaram os atos pelo impeachment nessa nova conjuntura? Por fim, quais rumos podemos tomar como resistência de esquerda nas ruas, escolas, universidades e locais de trabalho?

Uma das perdas que vêm com o pacote de retrocessos apresentado pelo governo de Michel Temer é a Medida Provisória 746, a qual altera o Ensino Médio. No entanto, muito antes de Temer começar a sonhar com o cargo presidencial – antes mesmo de ser mero vice decorativo de Dilma – já havia todo um setor do empresariado nacional articulado, ansiando pelo momento de colocar seus interesses bilionários na mesa. O movimento chamado “Todos Pela Educação” foi um dos grupos ouvidos pelos parlamentares acerca da reformulação do Ensino Médio, entre outros agentes poderosos esmiuçados na reportagem do The Intercept. O “Todos Pela Educação” existe desde 2005 e reúne grupos como Itaú, Unibanco, Bradesco, Gerdau, Santander, Globo, AmBev, Gol, Vale, Natura, McKinsey, Telefônica, DPaschoal, Microsoft e Abril, seguindo as diretrizes do Banco Mundial. Não se trata, então, apenas das vontades de um Executivo impopular ou de um Legislativo majoritariamente alinhado com a Presidência, falamos aqui de um grupo de bilionários e pessoas ligadas ao mercado financeiro que, através de seu braço social, pintam de filantrópicas suas estratégias de longo prazo: para um aumento dos seus lucros, a escola precisa servir mais adequadamente aos seus fins, produzindo o tipo de mercadoria adequada ao sistema que lhes serve, isto é, trabalhadores qualificados e subservientes. A MP 746 é uma deforma empresarial do Ensino Médio, o que coloca em cena um modo legalizado de corrupção: o aparelhamento da educação pública pelos gestores privados.

Não muito diferente da MP 746, está a Reforma da Previdência. Os grupos que dançam em cima dos direitos dos trabalhadores, pela articulação do secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano, são quase os mesmos que querem sambar na educação. Bancos como Itaú, Santander e Bradesco, além de representantes de fundos de investimento e fundos de pensões, foram recebidos inúmeras vezes pelo secretário, enquanto as centrais sindicais apenas uma vez, às vésperas da apresentação da proposta. A agenda do secretário, assim como o propósito da reforma, atende a um grupo bem específico, beneficiando exclusivamente os investidores e banqueiros, com destaque para a instituição líder no mundo em serviços financeiros e umas das maiores empresas do mundo, a estadunidense JP Morgan, conhecida por incentivar a inserção de práticas neoliberais na economia de países mundo afora. Segundo a Fenaprevi, representante das previdências complementares (privadas), a procura pelo serviço deve crescer 25% no próximo ano.

Nesse jogo de forças que coordena o governo de Temer, resta só o interesse dos grandes poderosos do mercado mundial. Enquanto os de cima sobem, os de baixo descem: a receita real das micro e pequenas empresas (MPEs) de São Paulo caiu pelo 21º mês consecutivo, por exemplo. Mesmo setores do mercado financeiro, muito alinhados com o impeachment, já falam publicamente sobre o “inferno astral” econômico. Se está difícil no meio da pirâmide econômica, para a classe trabalhadora que (a) sustenta isso tudo a realidade é ainda mais catastrófica. De um ano para cá, tivemos aumento de 3,6 milhões de pessoas desempregadas, somando total 12 milhões de pessoas no país. Se antes já parecia piada, agora não há mais como trabalhar sem pensar na crise!

Mas em qual crise pensamos? Além da econômica, atravessamos uma crise política, impulsionada em grande parte pelos escândalos reunidos pela Operação Lava Jato, que nos últimos dias atingiu a voadoras deputados e senadores, além de inúmeros ministros do atual governo e o próprio presidente ilegítimo. Altos nomes no PSDB, partido igualmente imbricado nas denúncias, já disputam internamente um afastamento do governo para não sujarem seus nomes. Enquanto isso, mantêm como carta na manga o pedido de cassação da chapa Dilma-Temer no TSE, que pode ser usado para tentar novas eleições e chegar ao poder de forma direta quando Temer for dispensável. Por meio das delações premiadas com executivos da empresa Odebrecht, caem um a um os aliados de Temer na rede dos corruptos. O interesse da empresa em manter certos parlamentares nos espaços representativos elucida o quão fraco é apostarmos na queda de uma só figura como garantia, pois, segundo um dos próprios executivos, a relação com representantes do legislativo é importante porque eles “apoiam projetos de nosso interesse e possuem capacidade de influenciar os demais agentes políticos”.

A Lava Jato, então, parece vir para reacender a esperança no cenário político, pois garantiria a limpeza nos espaços representativos. No cenário de escândalos, Sérgio Moro viria como o redentor: no último protesto na Avenida Paulista, no dia 04 de dezembro, via-se o boneco do Super Moro sendo carregado pelos manifestantes. Disfarçado de justiça, sustentando a falácia da imparcialidade, parte da população o deixa agir como se não tivesse lado, como se pairasse por cima dos interesses. Porém, esse juiz de Curitiba – com o poder do supersalário acima do teto da lei – não apenas emite mandado de prisão para corruptos, mas também ri e troca confidências com eles em premiação de revista, como vimos na foto do ano ao lado de Aécio Neves. Além da evidente parcialidade das investigações, Moro carrega a responsabilidade pelo atropelo da presunção de inocência e outras bases do Estado “Democrático” de Direito, assim como sustenta o chamado “pacote anti-corrupção” que dá enormes poderes aos Ministérios Públicos e Judiciário, estimulando o punitivismo e desprezo com que já tratam as classes oprimidas da sociedade. Na luta por um país mais igualitário, que não esteja na mão dos corruptores do poder econômico, não há salvadores da pátria, não há Sérgio Moro que retirará o povo de sua agonia. “O que transforma o velho no novo, bendito fruto do povo será”.

No entanto, se nós somos o povo, cadê a gente? A grande mídia tem dito muito que o povo foi às ruas, principalmente quando trata das manifestações do Movimento Brasil Livre e grupo Vem Pra Rua. Porém, não é o que a análise desses atos nos levam a concluir: primeiro, os números apontam que esses atos diminuíram muito em tamanho. Além disso, o perfil dos manifestantes era majoritariamente de pessoas velhas e brancas, um sub-setor bem específico da sociedade, com uma ampla gama de pautas, desde grupos contra o aborto até defensores do retorno da ditadura militar. Os próprios grupos organizadores trocaram farpas antes dos atos, mostrando que os setores que se uniram pelo impeachment não têm unidade no Governo Temer, apesar de continuar blindando o ilegítimo até então. É evidente que o “povão” ainda não foi à rua, em nenhuma das manifestações anteriores. É essa maioria popular que será o fiel da balança, mudando a situação de figura, caso se mobilize por um lado ou por outro. O que não há dúvidas é que o Governo Temer e o grande empresariado estão de panelinha no ataque a essa massa popular, trabalhadoras e trabalhadores, pessoas usuárias dos serviços públicos.

A realidade se apresenta dinâmica, caótica, mas também estimulante. Perdemos a batalha da PEC 55, mas a combinação entre crise econômica, desemprego crescente, Reforma da Previdência, assim como a desmoralização causada nas principais figuras políticas pelas delações da Lava Jato, proporcionam uma enorme indignação popular, capaz de extravasar a qualquer momento para um lado ou para outro.

Usaremos todos os nossos esforços contra a raiz de nossos problemas e não contra seus galhos podres. Não adianta tirar Michel Temer sem jogar na lata de lixo suas medidas liberais e privatistas. A luta é pelo SUS; pela educação pública crítica e abrangente; pelo direito à aposentadoria digna; pela demarcação das terras indígenas; pela auditoria da dívida pública; pela democratização da mídia; pelo fim da Polícia Militar. A luta não é contra um indivíduo, é contra uma estrutura de interesses e privilégios que não nos representa!

A SAÍDA É COLETIVA! Quando os de baixo se movem, os de cima caem!

E finalmente: LIBERDADE PARA RAFAEL BRAGA!

Frente de Arte e Resistência CENTOSPÉ
dezembro de 2016

Referências:

“Conheça os bilionários convidados para reformar a educação brasileira de acordo com sua ideologia” (The Intercept)

“Algo de podre no ar: quando as empresas elogiam a luta secundarista” (Passa Palavra)

“Agenda de secretário da Previdência é dominada pelo mercado financeiro” (Carta Capital)

“Previdência complementar deve acelerar em 2017, diz entidade do setor” (Folha)

“Empresários se desdobram para driblar quase dois anos de crise no Brasil” (El País)

“Frases do dia. A conjuntura do final de semana em destaque” (IHU Unisinos)

“Delação da Odebrecht revela troca de leis por doações a campanhas do PMDB” (El País)

“Com Temer, tucanos e famosos, Moro recebe prêmio e defende judiciário” (Folha)

“O pacote anticorrupção do STF e o fator Minority Report” (Lenio Streck)

“Sobre a Campanha Pela Liberdade de Rafael Braga”